Um especialista em ciências políticas angolano apontou esta segunda-feira condicionalismos financeiros e a não indicação de membros em instituições públicas como impactos caso a UNITA não tome posse no parlamento de Angola e não acredita que o partido “corra riscos”.
Para Sérgio Dundão, que falava à Lusa sobre a “incerteza” da posse dos 90 deputados da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA, na oposição), eleitos em 24 de agosto, o maior impacto seria a questão orçamental.
“Se a UNITA não tomar posse, eles deixam de receber o financiamento do Orçamento Geral do Estado [OGE] e torna-se muito difícil a UNITA que é um partido e tem compromissos financeiros manter ou preservar o seu partido a funcionar”, afirmou Sérgio Dundão.
“A nossa lei prevê que o partido que tem representação parlamentar é que pode receber o dinheiro do OGE durante cinco anos”, frisou, observando que a UNITA não poderá correr tal risco por “viver também às custas do financiamento público”.
Um segundo impacto, apontou, “é que com ausência de deputados da UNITA” o MPLA, declarado vencedor das eleições gerais, “terá a possibilidade de fazer uma revisão constitucional”, pois o quórum “seria formado pelos deputados em efetividade de funções”.
“A nossa Constituição revista não define um quórum e refere apenas de deputados em efetividade de funções, que é dois terços de deputados em efetividade de funções”, sublinhou o especialista.
Sérgio Dundão, também investigador em áreas de políticas sociais, referiu igualmente que, num terceiro impacto, a UNITA deixaria de indicar membros para a ERCA (Entidade Reguladora da Comunicação Social Angolana) para a CNE (Comissão Nacional Eleitoral) e para o Tribunal Constitucional (TC).
“Ou seja, não poderia indicar por não estar representado na Assembleia Nacional e, além disso, também os membros da UNITA não estariam no Conselho da República e também não teriam imunidades necessariamente”, realçou.
“Não acredito que a UNITA corra esses riscos todos, daí que sou favorável a que eles assumam os lugares no parlamento”, notou.
A UNITA, maior partido na oposição angolana, disse esta segunda-feira que pondera tomar posse no parlamento angolano, considerando que a sua posição definitiva terá em vista a salvaguarda da paz e a consolidação da democracia, enquanto outros partidos na oposição se manifestam divididos.
Segundo o porta-voz da UNITA, o partido avalia todos os cenários, não descartando, no entanto, a posse no parlamento.
“Estamos a conversar sobre todas essas questões, sobre os vários cenários possíveis e é uma dicotomia entre tomar [posse] ou não. A discussão é em torno dessas duas abordagens e penso que só na quarta-feira é que poderemos surgir com propriedade e dizer o que faremos”, afirmou Marcial Dachala à Lusa.
Sérgio Dundão considerou ainda que caso os deputados da UNITA não tomem posse, em cerimónia de investidura agendada para 16 de setembro, “não se poderá aplicar qualquer renúncia ou penalização”.
“Porque tecnicamente o que a UNITA iria fazer nem sequer é efetivar o mandato, não seria renúncia, mas é não assumir o mandato, a UNITA por exemplo não corre qualquer risco de penalização ou extinção”, argumentou.
O especialista recordou ainda a Constituição angolana tendo em conta o período de 1992, ano em que Angola realizou as primeiras eleições, onde, realçou, os deputados da UNITA não aceitaram os resultados e não tomaram posse na altura.
“Eles, naquele período, não aceitaram os resultados eleitorais e não efetivaram mandato, mais tarde depois com os acordos já de Lusaca a UNITA renovada acabou por tomar posse e essa situação não seria inédita”, concluiu.