Depois de mais de uma década à frente do Governo, o Partido Islâmico Moderado Justiça e Desenvolvimento (PJD) sofreu uma pesada derrota nas eleições legislativas em Marrocos. A vitória eleitoral pertenceu ao liberal RNI (National Rally of Independents), liderado pelo bilionário Aziz Ajanuch, que conquistou 97 dos 395 lugares na Câmara dos Representantes.
O PJD, que governa o país desde 2001, obteve 12 assentos na Câmara dos Representantes (câmara baixa do parlamento marroquino), caindo do primeiro (com 125 deputados) para o oitavo partido mais votado.
O RNI liderado pelo ministro da Agricultura e Pescas, o bilionário Aziz Ajanuch, amigo do rei Mohamed VI, foi o vencedor das legislativas de quarta-feira que decorreram juntamente com as eleições regionais e municipais.
O segundo lugar é ocupado pelo Partido da Autenticidade e Modernidade (PAM, liberal) – fundado em 2008 por Ali Fual el Himma que é atualmente o principal conselheiro do monarca- com 82 lugares, o Partido Istiqlal (PI, nacionalista) foi a terceira força política mais votada (78).
Segue-se a União Socialista das Forças Populares com 35 lugares, o Movimento Popular com 26, o Partido do Progresso e Socialismo (20) e a União Constitucional (18).
A votação decorreu sem grandes incidentes, além das queixas do PJD e de outro partido minoritário, o Partido Socialista Unificado (PSU), sobre práticas ilegais de compra de votos e suborno de eleitores.
Aziz Ajanuch era o favorito
Apesar das sondagens serem proibidas em Marrocos, o magnata do petróleo Aziz Ajanuch – dono da primeira fortuna privada do país – era o favorito para vencer as legislativas, após uma década dos islâmicos à frente do Governo.
O RNI será agora obrigado a formar Governo de coligação, como acontece desde 2011. Em Marrocos, não há nenhuma instituição cujo poder possa ser equiparado ao do rei, apesar de o monarca ter reduzido ligeiramente os seus poderes depois da Primavera Árabe.
Os chamados “ministérios da soberania”, do Interior, Negócios Estrangeiros e Assuntos Religiosos, continuam a depender diretamente do Palácio Real.
A nomeação do novo chefe do Governo está agora nas mãos do rei, uma vez que a coligação já foi negociada. O bilionário Azis Ajanuch não concorreu como candidato à liderança, mas sim como presidente da Câmara de Agadir. No entanto, a Constituição permite ao monarca colocá-lo à frente do executivo.
Ajanuch é, desde 2007, ministro da Agricultura e Pescas, um órgão fundamental em Marrocos w nas relações com a União Europeia.
As eleições foram realizadas sob fortes medidas sanitárias, já que Marrocos está sob uma terceira vaga da pandemia da Covid-19 e recolher obrigatório em todo o país, tendo restringido a campanha a eventos ‘online’ e a caravanas de carros nas ruas.
Estas são as terceiras eleições desde a aprovação da nova Constituição de Marrocos, em 2011, nascida durante a chamada ‘Primavera Árabe’ e que deu mais poderes legislativos, numa monarquia constitucional onde o rei ainda possui um grande poder.
Nos programas eleitorais, os partidos apresentaram propostas para superar a crise económica e sanitária, mas não incluíram avanços nos direitos individuais, como a descriminalização de casos extraconjugais, homossexualidade, aborto ou quebra do jejum no Ramadão.
A derrota do PJD
Analistas políticos, ouvidos pelo jornal El País, estimam que os islamitas do PJD podem perder, além da chefia do Governo, alguns autarcas das principais cidades o país, como Rabat, Casablanca, Marraquexe, Fez e Tânger. O que ninguém previa é que a derrota do PJD fosse tão estrondosa.
Nos dez anos em que estiveram à frente do poder, os líderes o PJD foram caracterizados pela sua integridade mural. A corrupção não os atingiu e esse tem sido o seu baluarte. O seguimento absoluto que demonstraram às diretrizes emanadas pelo Palácio Real foi outra das suas marcas de governação.
O que marcou um antes e um depois na governação do PJD foi o seu apoio em dezembro à normalização das relações com Israel. Uma medida que foi promovida pelo rei, na sequência de um acordo tripartido entre Marrocos, Israel e Estados Unidos, através do qual o então Presidente norte-americano, Donald Trump, reconheceu a soberania de Rabat sobre o Sahara Ocidental.
O PJD conseguiu superar a situação sem desmoronar, apesar de alguns ativistas reivindicarem a causa palestiniana nas redes sociais.