O antigo primeiro-ministro de Angola Marcolino Moco criticou a repressão policial durante duas manifestações, em 24 de Outubro e 11 de Novembro, e considerou que o país regressou aos “métodos autoritários que não levam a lado algum”.
“[As manifestações que acabaram por ser fortemente reprimidas pela polícia] atingiram uma gravidade que não esperaria”, escreveu Marcolino Moco, na rede social Facebook, que pertence ao Movimento Popular da Libertação de Angola (MPLA), partido do qual também faz parte o Presidente angolano.
“É muita pena ver, e num ambiente económico e social muito deteriorado, que se volte agora, e de forma tão explicita, a usar-se dos mesmos métodos autoritários que não levam a lado algum, especialmente, num tempo em que dominam as novas tecnologias de comunicação”, prosseguiu o antigo primeiro-ministro.
Marcolino Moco acrescento que o que “vem acontecendo de desastroso e lamentável, assim acontece, e desde até antes” da independência de Angola, porque a “elite liderante” não colocou o “acento tónico na ideia ‘do bem comum’”, mas em “interesses de grupo”.
A sociedade angolana está “desprovida de uma estratégia de interesse nacional, em ambiente de construção de um estado-nação eivado de grande complexidade”, acrescentou o também antigo secretário executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
“Assim não vamos lá. Mas ainda vamos a tempo – penso eu – e as esperanças têm de manter-se, agora que um novo ano se aproxima”, disse ainda Marcolino Moco.
Em 24 de outubro e 11 de Novembro duas manifestações em Luanda que tinham sido proibidas pelas autoridades angolanas, invocando as medidas vigentes na situação de calamidade pública, foram fortemente reprimidas pela polícia, com recurso a gás lacrimogéneo.
Um estudante de 26 anos morreu na sequência de confrontos entre polícias e os grupos de jovens que queriam manifestar-se pela melhoria das condições de vida e eleições autárquicas em 2021, na passada quarta-feira.
A polícia garantiu ter usado apenas meios não letais e negou responsabilidades na morte do jovem, mas testemunhas que se encontravam no local garantem que Inocêncio de Matos foi baleado.
O relatório médico produzido no hospital Américo Boavida refere que o estudante morreu devido a uma agressão com um objecto contundente não especificado, mas a família rejeita estas explicações e o seu advogado anunciou que vai processar o Estado e a polícia angolanos.
Integra da posição de Marcolino Moco
Há uma perplexidade, manifesta ou não, de quem esperaria de mim uma palavra, depois dos acontecimentos de 11 de Novembro, especialmente, em algumas ruas de Luanda, que atingiram uma gravidade que não esperaria, francamente. Culminando com a morte falada de, pelo menos, mais uma preciosa vida. E, naturalmente, uma comoção nacional, embora para o bem e ou para o mal, ainda contida.
Não me vou pronunciar, de modo concreto, sobre o assunto concreto, repetindo a razão já apresentada no post anterior: a politização que tem, fatalmente, acompanhado as minhas intervenções, criando embaraços desnecessários, não tanto à minha própria pessoa que “já sou cinza”, como diria o bom Velho Mendes de Carvalho, mas especialmente a pessoas que de uma ou outra forma me são próximas. Por causa deste subliminar medo (as vezes já um pouco mais do que isso) que volta a pairar, infelizmente, sobre as nossas cabeças.
O que quero dizer (repetir), simplesmente, é que é minha convicção que tudo o que vem acontecendo de desastroso e lamentável, assim acontece, e desde até antes da nossa independência, porque como elite liderante não colocamos o acento tónico na ideia “do bem comum”, mas sim, nos nossos interesses de grupo.
Na sequência, a própria sociedade, por inteiro, não tem como – desprovida de uma estratégia de interesse nacional, em ambiente de construção de um estado-nação eivado de grande complexidade – deixar de limitar-se a debruçar-se de caso concreto a caso concreto das suas angústias existenciais de ordem material e espiritual imediatas.
Há cerca de mais ou menos 20 anos, chegado a essa conclusão, deixei de me envolver, tão afincadamente, numa corrente de acção político-partidária, onde não encontrava espaço para agir com qualquer esperança de obter algum resultado, no quadro daquilo em que acredito. É assim que opto, desde então, por uma acção de crítica construtiva ao sistema, numa longa parte do longo consulado do presidente José Eduardo dos Santos.
O novo consulado do Presidente João Lourenço acalentou-me, e sem dúvida à muita gente, muitas esperanças. É muita pena ver, e num ambiente económico e social muito deteriorado, que se volte agora, e de forma tão explicita, a usar-se dos mesmos métodos autoritários que não levam a lado algum, especialmente, num tempo em que dominam as novas tecnologias de comunicação.
E ai, Deus! esta ideia, denunciada pelo próprio Presidente, no dia da sua investidura, de encontrar culpas à direita e à esquerda, menos no lugar onde elas se encontram! Assim não vamos lá. Mas ainda vamos a tempo – penso eu – e as esperanças têm de manter-se, agora que um novo ano se aproxima.