Eurodeputada Eva Kalil, uma dos 14 vice-presidentes do órgão, segue detida após operação que apura compra de apoio político supostamente pelo Catar.
A eurodeputada grega Eva Kaili, uma das 14 vice-presidentes do Parlamento Europeu, é um dos quatro suspeitos denunciados e que permaneciam detidos neste domingo (11/12) em Bruxelas, após uma operação anticorrupção deflagrada na sexta-feira que apura tráfico de influência e compra de apoio político supostamente pelo Catar, país anfitrião da Copa do Mundo, segundo reportagens da mídia europeia.
“Quatro indivíduos foram detidos pelo juiz de investigação de Bruxelas que lidera a investigação”, disse o Ministério Público Federal belga em um comunicado. “Eles são acusados de participação em organização criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção.”
O comunicado não nomeia os suspeitos, mas a agência de notícias AFP e jornais belgas informaram que Kaili estava entre os denunciados, citando fontes judiciais.
Além de Kaili, a mídia belga identificou como denunciados seu assessor parlamentar Francesco Giorgi e o ex-eurodeputado social-democrata italiano Pier Antonio Panzeri. Um lobista de Bruxelas, que também foi denunciado e segue detido, não foi identificado.
Outras duas pessoas que também haviam sido detidas na sexta-feira foram colocadas em liberdade. Segundo a mídia belga, elas seriam o pai de Kaili e Luca Visentini, secretário-geral da Confederação Internacional de Sindicatos.
Kaili perde os poderes de vice-presidente
Kaili teve sua casa revistada na sexta-feira, depois que seu pai teria sido flagrado saindo de um hotel com milhares de euros em uma bolsa, de acordo com reportagens da mídia belga.
No total, 600 mil euros (R$ 3,3 milhões) foram apreendidos pela operação, que fez buscas em 16 endereços em Bruxelas.
No sábado, Kaili foi destituída de seus poderes como uma dos 14 vice-presidentes do Parlamento Europeu, que tem sedes em Bruxelas e em Estrasburgo.
Ela ainda é eurodeputada e tem imunidade contra processos criminais, mas essa regra não se aplica em casos de prisões em flagrante. Segundo fontes judiciais, a polícia belga a deteve na posse de “malas de dinheiro”.
A prisão de Kaili foi seguida de pedidos pela sua renúncia. O partido de esquerda grego PASOK anunciou que iria expulsá-la, e o grupo político de esquerda no Parlamento Europeu ao qual o PASOK pertence a suspendeu.
Eurodeputado belga também é alvo de buscas
A casa de um segundo eurodeputado foi alvo de busca e apreensão no sábado, em conexão com a mesma investigação, disse o Ministério Público.
Mais tarde, o eurodeputado social-democrata belga Marc Tarabella confirmou que sua casa havia sido vasculhada e que ele teve um computador e um telefone celular apreendidos.
“O sistema de Justiça está fazendo seu trabalho de colher informações e investigar, o que eu considero totalmente normal. Não tenho absolutamente nada a esconder e responderei a todas as questões dos investigadores”, ele afirmou em um comunicado.
O Ministério Público Federal belga disse que suspeitava há vários meses que um país do Golfo – identificado pela mídia belga como sendo o Catar – teria pago grandes quantias de dinheiro e oferecido presentes a pessoas influentes dentro do Parlamento Europeu.
O Catar enfrentou duras críticas sobre seu histórico de direitos humanos na preparação para a Copa do Mundo, inclusive devido à morte de trabalhadores migrantes durante a construção da infra-estrutura, incluindo estádios, para o torneio.
Votação sob suspeita
Em 22 de novembro, Kaili disse no Parlamento Europeu que a Copa do Mundo no Catar era “uma prova concreta de como a diplomacia esportiva pode levar a uma transformação histórica de um país cujas reformas inspiraram o mundo árabe”. Segundo ela, o Catar era “um líder em direitos trabalhistas”.
Pouco antes desse discurso, Kaili havia se reunido com o ministro do Trabalho do Catar, Ali bin Samikh Al Marri. Em uma mensagem de vídeo, ela descreveu a Copa do Mundo como um “grande instrumento para mudanças e reformas políticas”.
Em 1º de dezembro, ela e Tarabella votaram a favor de um projeto para isentar nacionais do Catar da necessidade de visto para entrar na União Europeia (UE), que tramitava em um comitê parlamentar do qual nenhum dos dois participa.
A proposta seria votada pelo plenário do Parlamento na próxima semana, mas alguns eurodeputados agora defendem que a discussão seja adiada devido à operação.
Trabalham em Bruxelas cerca de 25 mil lobistas, que regularmente tentam influenciar decisões políticas, mas o escândalo vem sendo descrito como o caso mais flagrante de suposto tráfico de influência no Parlamento Europeu nos últimos anos.
O correspondente da DW em Bruxelas, Jack Parrock, disse que a operação provocou “ondas de choque através das instituições da UE”. “O Parlamento Europeu se apresenta como o bastião da democracia, dos direitos e dos valores na União Europeia. Portanto, é um grande problema de reputação para eles, bem como para o Catar.”
A presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, afirmou por meio de seu porta-voz que o órgão e ela “estão firmes contra a corrupção, e cooperando ativamente e integralmente com as autoridades de aplicação da lei e judiciais para auxiliar o trâmite judicial”.
Catar rejeita acusações de má conduta
A missão diplomática do Estado do Golfo na UE divulgou uma declaração no domingo dizendo que “rejeita categoricamente qualquer tentativa de associá-lo a acusações de má conduta. Qualquer associação do governo do Catar com as acusações relatadas é infundada e gravemente desinformada”.
A declaração acrescentou que o Catar “trabalha por meio de contatos entre instituições e opera em total conformidade com as leis e regulamentos internacionais”.
DW, AFP, AP, Reuters, EFE, DPA