Crianças deslocadas do conflito de Cabo Delgado com 11 anos estão a ser casadas à força com homens mais velhos (40 a 50 anos de idade) para elas e as famílias poderem sobreviver, alerta a organização não-governamental (ONG) Care.
“As meninas casam-se entre os 12 e 17 anos, mas nalguns casos até se casam antes disso, com 11 anos. Às vezes, os pais oferecem-nas em casamento porque precisam de recursos e ficam com menos uma boca para alimentar”, descreve Graça Gonçalves, agente para questões de género da Care.
Outra vezes, “as meninas ficam separadas dos pais, durante a fuga dos locais de conflito, tornando-se nas novas chefes de família e precisam de fornecer comida para os irmãos mais novos”, acrescenta, citada num comunicado da ONG.
A situação não é nova – Moçambique já era um dos países do mundo com maior taxa de casamentos precoces -, mas está a agravar-se com o conflito.
“O casamento infantil é um grande problema porque as pessoas fogem sem nada e os campos de deslocados não têm recursos suficientes e estão sobrelotados”, sublinha Graça Gonçalves.
A falta de instalações sanitárias, de locais de banhos, a ausência de espaços separados para mulheres e meninas ou o simples facto de estarem mais distantes “deixa as mulheres e meninas vulneráveis a ataques, especialmente durante a noite”, descreve.
Uma das actividades realizada pela Care consiste em mostrar às mulheres e jovens como devem denunciar abusos e como podem defender-se.
Há uma semana, o Alto-Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) referiu que a guerra em Cabo Delgado está a provocar um aumento de casos de gravidez precoce devido a abusos sexuais de menores.
Os alertas juntam-se a outro lançado há um mês pelo Centro de Integridade Pública (CIP), ONG moçambicana, sobre abusos sexuais contra mulheres deslocadas, em troca de ajuda humanitária, considerando haver silêncio do Governo e Nações Unidas sobre o assunto.
Apesar das questões colocadas pela Lusa, não houve reações ao relatório do CIP.
A violência armada em Cabo Delgado, norte de Moçambique, está a provocar uma crise humanitária com cerca de duas mil mortes e 500 mil pessoas deslocadas, sem habitação, nem alimentos, concentrando-se sobretudo na capital provincial, Pemba.
A província onde avança o maior investimento privado de África, para exploração de gás natural, está desde há três anos sob ataque de insurgentes e algumas das incursões passaram a ser reivindicadas pelo grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico desde 2019.