Um cidadão português que conseguiu ser retirado de Palma e que pediu para não ser identificado, por medo de represálias, disse à RFI que tem “sorte de estar vivo” depois dos ataques e da fuga da vila de Palma, no norte de Moçambique.
Um cidadão português que conseguiu sair de Palma e que pediu à RFI para não ser identificado, por temer represálias, descreveu um cenário de muito medo na região, depois dos ataques que começaram na quarta-feira.
“Tive sorte de estar vivo mas isto é um trauma que vou ter, por toda a vida, porque já esta noite acordei ouvindo tiros e não sei das pessoas amigas, dos conhecidos, não sei de ninguém”, testemunhou.
Este Domingo, um navio com centenas de pessoas, nomeadamente trabalhadores expatriados da empresa francesa Total, chegou ao porto de Pemba, oriundo de Palma.
Por sua vez, a Total suspendeu as suas operações na península de Afungi, em Palma. Recorde-se que os ataques terroristas começaram um dia depois do anúncio da retoma dos trabalhos de exploração de gás na bacia do Rovuma. A petrolífera francesa tem o maior investimento no continente africano, na área do petróleo e gás, e volta assim atrás na sua decisão de retomar a actividade devido à violência extremista.
A real situação no distrito de Palma é ainda desconhecida. A comunicação telefónica está cortada desde a tarde de quarta-feira.
Outro testemunho assustador é o de Arnaldo Júlio, ouvido pela agência Lusa: “A minha esperança é que eles voltem vivos para Pemba, principalmente o meu tio que viu a esposa a ser degolada. Não sei o que aconteceu com ele.”
Também ouvidos pela agência Lusa à chegada a Pemba José Abebe chorava enquanto procurava saber do partadeiro do filho e Patrício Amade, residente em Palma, não tinha notícias da família.
“Que me ajudem na comunicação para ver se eu localizo o meu filho !” implorava José Abebe enquanto Patrício Amade dizia que “desde quarta-feira que não tinha contacto com a família”.
Um número incalculado de pessoas está desde quarta-feira a fugir para a península de Afungi. Um grupo mais restrito, de cerca de 200 cidadãos de diferentes nacionalidades, refugiou-se no hotel Amarula, de onde muitos foram sendo resgatados por terra e mar para a área controlada pela petrolífera Total. Uma das caravanas foi atacada na noite de sexta-feira e pelo menos sete pessoas morreram, mas fontes que acompanham as operações admitem que o número de baixas esteja subavaliado.
O ataque desencadeado na quarta-feira é o mais grave junto aos projectos de gás após três anos e meio de insurgência armada à qual a sede de distrito tinha até agora sido poupada. O Ministério da Defesa moçambicano anunciou na manhã de quinta-feira que estava no terreno a reprimir a ofensiva rebelde, mas não voltou a dar mais informações.
A violência que grassa desde Outubro de 2017 está a provocar uma crise humanitária com quase 700 mil deslocados e mais de duas mil mortes. Algumas das incursões foram reivindicadas pelo autoproclamado grupo ‘jihadista’ Estado Islâmico entre Junho de 2019 e Novembro de 2020, mas a origem dos ataques continua sob debate.