O presidente Lula e ministros de seu governo consideram que o presidente do Banco Central, Roberto Campos, traiu a confiança que o governo depositava nele para dialogar e participar de um esforço conjunto para que o Brasil supere os problemas econômicos que hoje enfrenta sem passar por uma recessão.
No entendimento do mandatário e de sua equipe, o governo atual, com pouco mais de um mês no poder, não tem responsabilidade sobre o déficit fiscal e a inflação, que impulsionam as taxas de juros. E mereceria um voto de confiança em seu compromisso de levar o rombo para 1% neste ano, e de zerá-lo em 2024.
Mesmo diante das metas claras, dizem interlocutores diretos de Lula, o Banco Central não apenas manteve a taxa básica de juros (Selic) em 13,75% ao ano pela quarta reunião consecutiva —a primeira desde que Lula tomou posse—, como endureceu o discurso e disse que deve deixar as taxas em patamares altos por mais tempo.
Com essa mensagem, o BC estaria dificultando a recuperação do crédito e a atividade econômica no país, e colocando o Brasil na rota da recessão.
Lula e o governo acreditam que os alertas feitos pelo Copom foram muito além do que seria necessário. E passaram a desconfiar da atuação de Roberto Campos, indicado ao cargo por Jair Bolsonaro para um mandato de quatro anos.
Ministros de primeiro escalão começaram a evitá-lo. E o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que o elogiava, já mostrou contrariedade com sua atuação.
Lula tem afirmado, segundo os mesmos interlocutores, que Campos foi tratado com respeito e consideração, e que não houve reciprocidade por parte dele.
O presidente do Banco Central sempre foi alinhado com o bolsonarismo.
Apesar da autonomia da instituição, aprovada no governo passado, Campos chegou a ir a jantares de Bolsonaro com empresários organizados para apoiar as medidas econômicas adotadas pelo presidente e pelo então ministro da Economia, Paulo Guedes.
Campos até discursava nos encontros, e admitiu em um deles que recebia conselhos de não ir a eventos com políticos que integravam o governo.
Mas justificava: como os ministros de Bolsonaro eram ‘técnicos’, não haveria problema em se misturar com eles. A proximidade não macularia sua autonomia e independência.
O presidente do Banco Central se mantém próximo dos bolsonaristas. Foi à posse de Tarcísio de Freitas no governo de São Paulo e, até meados do mês, seguia em um grupo de WhatsApp que reúne ex-ministros de Bolsonaro.
Em entrevista à Rede TV! nesta semana, Lula deixou claro que está contrariado com Roberto Campos, a quem se referiu como “esse cidadão”.
“Quero saber do que serviu a independência do Banco Central. Eu vou esperar esse cidadão [Campos Neto] terminar o mandato dele para fazermos uma avaliação do que significou o banco central independente”, disse Lula.
O BC divulgou o comunicado em que subiu o tom e contrariou o governo Lula na quarta (1º), depois de manter a Selic em 13,75%.
O texto fazia alertas sobre as incertezas fiscais e a piora nas expectativas de inflação, que estão se distanciando da meta em prazos mais longos.
Sinalizava ainda que o BC deve deixar os juros no patamar atual por mais tempo —hoje o mercado prevê o início do afrouxamento monetário em setembro.
“O Comitê reforça que irá perseverar até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas, que têm mostrado deterioração em prazos mais longos desde a última reunião”, afirmava o comunicado.
Por Mônica Bergamo