O político sul-africano Mangosuthu Buthelezi considera que a nova lei de expropriação de terras privadas sem compensação financeira do Governo vai afetar muitos portugueses na província do KwaZulu-Natal, litoral do país.
Em entrevista à agência Lusa, o príncipe Mangosuthu Buthelezi disse que “existem muitos que serão afectados”, sobretudo empresários, “como proprietários de hotéis, entre outros grandes negócios”, pela expropriação de terras no âmbito da política de “transformação económica radical” do Governo do Congresso Nacional Africano (ANC, na sigla em inglês), em curso desde as primeiras eleições democráticas, em 1994.
“Há restaurantes portugueses em todas as nossas cidades onde existe uma forte presença portuguesa”, referiu o príncipe Zulu Mangosutu Buthelezi, primeiro-ministro dos amaZulu, o maior grupo étnico no país.
Estima-se em 30.000 o número de portugueses radicados na província do KwaZulu-Natal, onde se dedicam a vários setores económicos, nomeadamente agricultura, indústria e serviços, disse fonte consular em Durban.
Várias organizações, que apresentaram no mês passado projetos ao parlamento sobre a proposta do Governo do ANC, no poder desde 1994, para a alteração da lei de expropriação de terras sem compensação financeira, acreditam que a mesma poderá também vir a afetar universalmente os direitos de propriedade.
O reino amaZulu é também o único no país que dispõe de três milhões de hectares de terras que o rei Goodwill Zwelithini ka Bhekuzulu (1948-2021), falecido no mês passado, administrava sob o Fundo Ingonyama, criado em 1994 para salvaguardar “o bem-estar material e social dos membros das tribos e comunidades” que fazem parte de 11,5 milhões de pessoas que habitam a província do KwaZulu-Natal, a segunda mais populosa do país.
“Uns dias antes do Governo do KwaZulu-Natal ter cessado funções para dar lugar ao novo regime político [a partir de 1994], aprovei uma lei chamada ‘Ingonyama Trust Act’ em que integrei todas as parcelas de terreno que faziam parte do reino numa estrutura corporativa, assegurando que o Rei ficasse como o seu único administrador”, explicou à Lusa o príncipe Zulu.
“O ANC ficou furioso acusando-me de ter feito um acordo secreto com o regime do ‘apartheid’, o que não é de todo verdade, porque naquela altura desfrutávamos de poder constitucional para o fazer (…) e o Sr. Frederik De Klerk [então Presidente da República] tinha de assinar a lei, eu abordei-o e ele assinou a legislação”, adiantou.
Mangosuthu Buthelezi, de 92 anos, também presidente emérito da quarta maior formação política na oposição na África do Sul, o Partido Livre Inkatha (IFP, na sigla em inglês), que fundou, em 1975, sublinhou que na província do KwaZulu-Natal os portugueses são “uma comunidade muito forte”, da qual é “muito próximo”.
“Devido a esta ligação, já visitei a Madeira e também Portugal”, recordou.
Na entrevista à Lusa, na sede do seu partido, em Ulundi, a principal cidade do Reino amaZulu, a cerca de 300 quilómetros do litoral do país, Buthelezi destacou ainda a participação dos portugueses no desenvolvimento económico da África do Sul.
“Os brancos em geral e os portugueses, em particular, contribuíram imenso para o desenvolvimento deste país, estão inseridos em vários setores de atividade económica, e por isso a contribuição dos portugueses abrange um segmento substancial do desenvolvimento da economia deste país”, referiu.
Questionado pela Lusa sobre se Portugal deveria investir na província do KwaZulu-Natal, o príncipe Zulu, que lidera a sucessão do rei Goodwill Zwelithini ka Bhekuzulu, defendeu esse investimento.
“Precisamos do investimento português também em toda a África do Sul, mas valorizo muito as minhas amizades porque há imensos portugueses e homens de negócios portugueses nesta província”, adiantou.
Todavia, acrescentou: “Se fosse investidor em Portugal, no Reino Unido e nos Estados Unidos, e fosse solicitado a investir aqui na África do Sul, e houvesse uma legislação para expropriar terras e sem compensação, eu não viria para cá”.
No funeral do rei Goodwill Zwelithini ka Bhekuzulu, em 18 de março, o príncipe Mangosuthu Buthelezi comprometeu-se a continuar a luta pela segurança da terra comunal na região, que tem “alimentado e nutrido” o povo.
“O povo Zulu já fez saber claramente que prefere morrer do que perder, e por isso não sei se [o Governo] terá coragem de fazer seja o que for”, afirmou, referindo-se à aplicação da nova lei.