Justiça angolana recebeu recentemente um cartão vermelho do Tribunal Supremo suíço, que recusou desbloquear milhões de dólares a favor de Angola. Supremo terá desconfiado de “mão invisível política” no caso São Vicente.
A Suíça suspendeu a cooperação com Angola no caso do empresário Carlos São Vicente, acusado de peculato e branqueamento de capitais. Uma decisão que desencadeou um novo debate sobre a imparcialidade da Justiça angolana.
O Tribunal Supremo suíço rejeitou o pedido da Justiça angolana para desbloquear as contas do empresário. Segundo os advogados de São Vicente, isso deve-se ao facto de o tribunal ter “sérias dúvidas” sobre se o empresário teve direito “a um julgamento justo em Angola”.
São Vicente foi condenado, em março, a nove anos de prisão. Mas a defesa denunciou “arbitrariedades” no processo.
Para Nkinkinamo Tussamba, especialista em Relações Internacionais, a justificação do Tribunal Supremo suíço deixa transparecer a falta de confiança na independência dos tribunais em Angola.
“Não é que eles estejam a defender o cidadão Carlos São Vicente. O que esteve na base da quebra de confiança na cooperação com Angola foi o Estado suíço perceber que ainda existe uma mão invisível política no processo”, diz Nkinkinamo Tussamba em declarações à DW África.
Outros casos que “mancham” a Justiça
O advogado Serrote Simão considera haver mais casos que têm manchado a imagem da Justiça angolana fora do país, como, por exemplo, o “chumbo” do Tribunal Constitucional aos recursos de contencioso apresentados pela UNITA e CASA-CE depois das eleições de 24 de agosto.
“Nós tivemos um acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional, nas vestes de tribunal eleitoral em que, até certo modo, o tribunal não esteve bem, se antedermos aos factos e a toda a situação normativa. Havia atos que o presidente da CNE praticou que contrariam o que está previsto na lei eleitoral”, comenta o advogado Simão Serrote.
Essa foi uma das queixas da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) quando apresentou o recurso de contencioso eleitoral. O maior partido da oposição acusou o presidente da Comissão Nacional Eleitoral, Manuel Pereira da Silva, de aprovar “vários regulamentos depois de se ter convocado as eleições gerais”, embora, de acordo com a lei, não fosse permitido aprovar qualquer “legislação eleitoral”.
Sendo assim, como é que a Justiça angolana poderá voltar a ganhar credibilidade aos olhos da comunidade internacional?, questiona Serrote Simão. O advogado entende que a solução é cortar o mal pela raiz.
Angola conseguirá recuperar a credibilidade?
“É preciso que o Estado, o poder político, deixe de interferir nos assuntos judiciais. Ou seja, é preciso que as instituições ajam simplesmente com base na Constituição, na lei e na consciência do juiz”, afirma Simão.
O analista Nkinkinamo Tussamba acredita que um possível julgamento do ex-vice-Presidente da República Manuel Vicente pode devolver a credibilidade da Justiça angolana junto da comunidade internacional.
“Será importante tentar resolver essa questão para poder recuperar a confiança dos suíços diante de um processo que envolve Carlos São Vicente”, afirma.
O antigo governante angolano foi acusado de corromper um magistrado português, tendo este já sido condenado pela Justiça portuguesa, enquanto se espera que o processo se desenrole em Angola. O caso terá causado causou um “irritante” entre Angola e Portugal.