Dois anos depois dos acontecimentos na Lunda Norte, ainda não há responsabilização para os crimes cometidos em Angola. Inquérito libertou a liderança acusada de orquestrar a mobilização, mas “isso não significa justiça”.
A investigação do caso do Cafunfocontinua parada. Dois anos depois dos acontecimentos em Lunda Norte, ainda não há responsabilização para os crimes cometidos em Angola naquele início de 2021.
O governo disse ter agido contra uma invasão a uma esquadra policial e contou seis mortes. Já a sociedade civil afirma que foram mais de 100 mortos em um massacre durante uma manifestação pacífica.
Segundo Zola Bamdi, presidente da organização Observatório para Coesão Social e Justiça, que foi responsável pelo relatório civil, a mobilização iniciou como um protesto legítimo. “O melhor para o Governo é que não haja vozes discordantes”, enfatiza. Bamdi defende que o conflito serviu para tirar areia nos olhos da população com relação as falhas e excessos do Estado e, por isso, as investigações estão paradas.
“O que estamos em conta na questão do Cafunfo é que houve um crime de Estado. Há envolvimento do topo da pirâmide. Por isso é que não havia interesse em se esclarecer o que aconteceu. Então era necessário um bode expiatório que tornaram os manifestantes. Eles foram levados a um processo injusto, [já] que a intenção era apresentá-los como responsáveis de algo que realmente não aconteceu”, explicou.
Amnistia a Zecamutchima
Uma das lideranças que havia sido acusada de orquestrar a mobilização na Lunda Norte foi Zecamutchima. Há quase um mêsliberto pela lei da amnistia, o presidente do Protetorado da Lunda Tchokwe diz que é um alívio estar livre de todas as acusações, mas lembra que isso não significa justiça.
“Eu fui ilibado de todo o processo. Mas é da nossa preocupação que o estado angolano, que fez terrorismo ao destruir e matar pessoas inocentes, indemnize as famílias”, disse.
Manutenção de segredos
Além de Zecamutchima, o Observatório para Coesão Social também reinvidica a investigação. Zola Bamdi enumera diversos crimes do Estado e enfatiza que o poder mantém segredo sobre todos eles.
“Foi muita gente jogada para o Rio Kwango, muitos corpos. Outros foram enterrados nas matas. Obrigaram os cidadãos a fazerem e muitos deles depois de o terem feito foram executados. É mesmo aberrante e inaceitável no século 21 que o Estado admita essas questões e não investigue a fundo. Como exemplo: quase todos os elementos das forcas (policiais e de segurança) foram transferidos. Ninguém trabalha agora naquela zona de Cafunfo, para guardarem o segredo”, afirma.
Bamdi também lembra que o relatório do Observatório que apurou esses crimes e as mortes foi feito sem nenhum suporte do Governo, mesmo durante a pandemia.
“Tivemos que ser inventivos. Foi constatado in loco, visitadas as famílias e temos a prova de que os atos aconteceram. Nós achamos as informações de formas mais simples, por vias telefónicas ou fotografias. E assim, realizamos esse relatório que estão os nomes, a antiga localização das pessoas, data e local de nascimento e o último dia que a família o viu e as circunstâncias, sobretudo, de como perderam as vidas”, relatou Bamdi.
Discordâncias e silêncio
Para o jornalista Rafael Marques, não se esconde 100 corpos no Cafunfo. Pesquisador da região há 30 anos, Marques afirma que o relatório tem incongruências e com a libertação do Zecamuchima o caso deveria ser considerado encerrado.
A procuradoria do Governo da Angola foi contatada na apuração dessa reportagem, mas se negou responder as questões sobre o caso do Cafunfo.
Por Laianna Janu