“Os insurgentes perceberam que atacar por via marítima era uma opção viável e que o risco de serem interceptados pela segurança marítima moçambicana é baixo”, entende o analista Timothy Walker.
Analista do Instituto de Estudos de Segurança da Universidade de Pretória, África do Sul, considera que a vertente marítima está a ganhar importância no conflito em curso na província de Cabo Delgado, norte de Moçambique.
Num artigo académico sobre os ataques na região, Timothy Walker refere que “nos últimos meses a insurgência sangrenta na província de Cabo Delgado teve uma viragem marítima sem precedentes que, se piorar, pode ter profundos impactos socioeconómicos e implicações de segurança para a África Austral”.
O analista recorda que o grupo inspirado pelo Estado Islâmico Al-Sunnah “lançou ataques frequentes nas vilas costeiras e usou ataques coordenados por mar e terra quando recapturou a cidade de Mocímboa da Praia”, o que para ele “mostra que os insurgentes perceberam que atacar por via marítima era uma opção viável e que o risco de serem interceptados pela segurança marítima moçambicana é baixo”.
Uso de vias marítimas pode escalar a violência
O grupo está a evoluir de um padrão de “ataques destrutivos” para a “ocupação temporária de cidades, numa escalada destinada a obter um controlo mais permanente sobre o território e as comunidades”, argumentou o analista, vincando que isto “aponta para uma escalada iminente no combate”.
A utilização crescente das vias marítimas pode escalar também não só do ponto de vista da violência na província, mas também na própria região.
“Nestas condições, há quem alerte que o norte de Moçambique pode tornar-se uma plataforma para o lançamento de assaltos e servir de base a redes criminosas na região, incluindo a pirataria, o que coloca um risco significativo, já que a actividade marítima é essencial para ajudar as pessoas deslocadas do país e o Governo está cada vez mais dependente das receitas das exportações de gás oriundas das enormes reservas ao largo da costa”, aponta o analista.
Importância da segurança marítima
Defendendo o envolvimento da Comunidade dos Países da África Austral (SADC), o analista argumenta ainda que “apesar de a segurança marítima em si própria não garantir vitória em terra contra a Al-Sunnah, pode fornecer uma âncora para garantir que as iniciativas de segurança ficam firmemente nas mãos do Governo de Moçambique e na SADC”.
Mocímboa da Praia é uma das principais vilas da província, situada 70 quilómetros a sul da área de construção do projecto de exploração de gás natural conduzido por várias petrolíferas internacionais e liderado pela Total.
A violência armada dos últimos dois anos e meio já terá provocado a morte de, pelo menos, 700 pessoas e uma crise humanitária que afecta cerca de 211.000 residentes.
As Nações Unidas lançaram, no início de Junho, um apelo de 30 milhões de euros à comunidade internacional para um Plano de Resposta Rápida para Cabo Delgado para ser aplicado de maio a Dezembro.