Seis organizações dos direitos humanos exigiram hoje justiça contra os autores do homicídio de mais de 150 manifestantes, violações e outros crimes cometidos há 11 anos pelas forças de segurança guineenses num estádio da capital da Guiné-Conacri.
Há precisamente onze anos, a 28 de Setembro de 2009, várias centenas de membros das forças de segurança da Guiné abriram fogo sobre dezenas de milhares de pessoas reunidas pacificamente no Estádio 28 de Setembro, em Conacri, para uma marcha contra a intenção de Dadis Camara concorrer à presidência.
As forças de segurança também violaram individualmente ou em grupo mais de 100 mulheres e agrediram sexualmente algumas delas com objectos como bastões ou baionetas, durante ou pouco depois dos acontecimentos. Ao todo, as forças de segurança mataram mais de 150 pessoas e feriram centenas de outras, organizando depois uma operação de encobrimento, selando todas as entradas do estádio e morgues e retirando os corpos para os enterrar em valas comuns, muitas das quais ainda não foram identificadas.
Os autores do massacre continuam sem ser julgados e as vítimas e os seus familiares exigem agora justiça, apoiados por seis organizações dos direitos humanos: A Associação de Vítimas, Parentes e Amigos de 28 de Setembro de 2009 (AVIPA), Igualdade de Direitos para Todos (MDT), a Organização Guineense de Direitos Humanos (OGDH), a Federação Internacional de Direitos Humanos, a Amnistia Internacional e a Human Rights Watch.
Estas organizações defendem que as autoridades guineenses deveriam agir imediatamente para assegurar que o julgamento dos crimes, há muito adiado, possa começar o mais cedo possível. Os parceiros internacionais e regionais da Guiné deveriam pressionar para que o julgamento se realize sem mais delongas, afirmam, lembrando que o Governo guineense e a União Europeia (UE), a França e os Estados Unidos já se comprometeram a apoiar o julgamento.
“O julgamento estava finalmente marcado para Junho, mas nada avançou”, disse o presidente da AVIPA, Asmaou Diallo, acrescentando: “A pandemia de Covid-19 pode ter criado novos desafios, mas o Governo deve assegurar que a abertura do julgamento volte ao bom caminho, para o bem das vítimas”. A investigação interna, iniciada em Fevereiro de 2010 e concluída em finais de 2017, progrediu lentamente, no meio de obstáculos políticos, financeiros e logísticos.
“Num país em que a impunidade prevalece em grande parte quando as forças de segurança estão implicadas em crimes, a conclusão de uma investigação credível enviou um sinal forte e suscitou esperanças para a abertura de um julgamento que poderia trazer justiça às vítimas”, referem as organizações, numa declaração conjunta. Alguns sobreviventes morreram enquanto o progresso do caso definhava e as vítimas sobreviventes continuam a exigir justiça.
“Desde esse dia choramos e depois secamos as nossas lágrimas e esperamos por justiça”, disse uma vítima num vídeo que os grupos emitiram no ano passado sobre a necessidade do início do julgamento. Mais de 13 suspeitos foram acusados – 11 deles foram enviados para julgamento, incluindo funcionários actuais e antigos altos funcionários.
Os suspeitos incluem Moussa Dadis Camara, o antigo líder do Conselho Nacional para a Democracia e Desenvolvimento, que governou a Guiné em setembro de 2009, que vive no exílio no Burkina Faso, e o seu vice-presidente, Mamadouba Toto Camara. Alguns dos suspeitos continuam a ocupar posições de influência, incluindo Moussa Tiegboro Camara, que é responsável pelo combate ao tráfico de droga e ao crime organizado.
Abubakar “Toumba” Diakité, assistente de Dadis Camara, também foi acusado e extraditado do Senegal para a Guiné, em Março de 2017, após ter escapado à justiça durante mais de cinco anos. Quatro outras pessoas que foram acusadas estão detidas na prisão central de Conakry, desde 2010, 2011, 2013, e 2015, respectivamente.
A sua detenção provisória é ilegal, dado que excede o limite máximo previsto na lei da Guiné, que é de 18 a 24 meses em matéria penal. O Tribunal Penal Internacional (TPI) abriu um exame preliminar à situação na Guiné em Outubro de 2009. Concebido como um tribunal de último recurso para os crimes mais graves, o TPI intervém quando os tribunais nacionais não podem ou não querem investigar e processar tais casos.