O Governo angolano garantiu reparar os danos às vítimas dos conflitos políticos, incluindo do 27 de Maio de 1977. O facto foi anunciado em Março, em Genebra, ao Comité de Direitos Humanos da ONU, pelo ministro da Justiça e dos Direitos Humanos.
Segundo Francisco Queiroz, o início do novo ciclo político, inaugurado pelo Presidente João Lourenço, em 2017, dá garantias de que os direitos humanos assumiram outra dimensão e atenção em Angola.
O ministro deu estas garantias às Nações Unidas, quando fazia a apresentação do Relatório Periódico sobre a Implementação do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos em Angola, na 125ª sessão ordinária do Comité dos Direitos Humanos.
“Nota-se, com efeito, um novo impulso nos direitos humanos, políticos e civis, destacando-se o encontro com as organizações mais representativas da sociedade civil, a comutação de penas de oito cidadãos presos e a libertação de quatro outros, condenados por crimes contra a segurança do Estado, e a elaboração de um estudo para reparar os danos sofridos pelas vítimas de repressão e por perseguição política, entre os quais as vítimas do ‘27 de Maio’ de 1977,” afirmou, na ocasião, o ministro.
De acordo com o JA, Francisco Queiroz assegurou que este mecanismo “não tem uma visão restritiva” e vai muito além do 27 de Maio, abrange “massacres e violências verificadas no período da guerra civil”, que se prolongou entre 1975 e 2002, além de “défices de governação”.
Isto é, casos em “que não foi observado o princípio do contraditório ou nem sequer houve processos” e foram “lesados os direitos das pessoas”, disse Francisco Queiroz.
Ainda sobre o alcance do ressarcimento das vítimas dos acontecimentos do 27 de Maio e seus familiares, o governante salientou que “há dois lados”: “a tentativa de golpe de Estado, que é condenável”, e a resposta a essa tentativa. Aqui, Francisco Queiroz reconhece a existência de “excessos, execuções e perseguições que se prolongaram no tempo” e que “são também condenáveis”.
Entre as vítimas do 27 de Maio estão José Van-Dúnem, irmão da actual ministra da Justiça de Portugal, Francisca Van-Dúnem, a mulher deste, Sita Valles, e Nito Alves, considerado o mentor da contestação a Agostinho Neto.
Os acontecimentos daquela data continuam a motivar diferentes interpretações e o processo de repressão, que se prolongou no tempo, causou um elevado número de vítimas.
Outras vítimas
Mas estas não serão as únicas vítimas com direito a ressarcimento, de acordo com os três princípios – a “historicidade, a reconciliação e o perdão” – que vão orientar a actuação do Governo e que reflectem um “novo ciclo político” nesta matéria em Angola.
Nas declarações, Francisco Queiroz destaca também as vítimas de “massacres e violências” sucedidos durante a longa guerra civil e protagonizados pelas forças da guerrilha (da UNITA) e pelas forças governamentais em “ambiente de guerra”.
Nestes casos, destaca o ministro, as investigações serão conduzidas tendo presente que “não se devem abrir novas feridas na sociedade angolana” e não se deve procurar “a retribuição”. O objectivo principal será o do “resgate da dignidade e honra das pessoas”.
A actuação do Governo, nestes pontos mais sensíveis, corresponde à “estratégia nacional para os direitos humanos”, que vai ser apresentada ao Presidente João Lourenço, e em que esta matéria é equiparada às “questões de Defesa, ordem Interna e Segurança Nacional”, referiu o ministro, recordando o “marco” que foi o encontro do Chefe de Estado, em finais de 2018, com representantes da sociedade civil, entre eles críticos declarados do Governo.
A importância que os direitos humanos passaram a ter em Angola pode atestar-se, reafirmou Francisco Queiroz, pelo facto de passarem a ser matéria analisada pelo Conselho de Segurança Nacional, órgão consultivo do Presidente da República, e ao qual se poderá dirigir agora a sociedade civil.
“Os angolanos devem ter a capacidade de acompanhamento, monitorização e denúncia dos casos de violações dos direitos humanos nas mais variadas circunstâncias”, considerou o ministro, que vão desde a actuação dos órgãos públicos às relações de emprego e a atentados à liberdade individual.