O Governo vai apresentar um relatório aos deputados à Assembleia Nacional sobre o trabalho do Executivo na gestão da crise na IURD em Angola. A decisão surge depois de o Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, ter enviado uma carta ao Presidente da República, João Lourenço, em que se diz preocupado com “os recentes episódios em Angola de invasões a templos e outras instalações da Igreja Universal do Reino de Deus”.
O relatório será elaborado pela comissão multissectorial da religião, coordenada pela ministra da Cultura, Turismo e Ambiente, Adjany Costa.
A informação foi avançada pela ministra de Estado para a Área Social, Carolina Cerqueira, esta sexta-feira, no Parlamento.
Para Carolina Cerqueira, a crise na IURD “não pode ser analisada unicamente do ponto de vista religioso, mas das consequências políticas e diplomáticas que podem advir dessa situação”.
Segundo a ministra, o Presidente da República, João Lourenço, deu orientações no sentido de se tratar a questão com as comissões de especialidade da Assembleia Nacional, não avançando, contudo, datas para o efeito.
A ministra afirmou que “há casos de justiça, há casos com indícios de crimes e devem ser tratados em fórum próprio e pelas entidades competentes”.
“Pensamos que há indícios de alguns crimes de violência física e verbal, que merecem tratamento dos órgãos competentes, de acordo com a lei angolana”, declarou.
Esta semana, o Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, enviou uma carta ao Presidente da República, João Lourenço, em que pede que seja aumentada a protecção dos membros da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) em Angola, “a fim de garantir a sua integridade física e material, e a restituição de propriedades e moradias”.
Na carta assinada pelo Presidente do Brasil, e divulgada no Twitter pelo seu filho, Bolsonaro diz-se preocupado com “os recentes episódios em Angola de invasões a templos e outras instalações da Igreja Universal do Reino de Deus”.
Na missiva enviada a João Lourenço lê-se ainda que se “registam relatos de agressões a membros da IURD, que em certos casos teriam sido expulsos das suas residências”.
Bolsonaro considera, na carta, que é “preciso evitar que fatos dessa ordem voltem a produzir-se ou sejam caracterizados como consequência de “disputas internas””.
O Presidente brasileiro lembra que “há perto de 500 pastores da IURD em Angola e, nesse universo, 65 são brasileiros”.
Para Bolsonaro, “os aludidos actos de violência são atribuídos a ex-membros da IURD, que também têm levantado acusações e, com isso, motivado diligências policiais na sede da entidade e nos domicílios de dirigentes seus”.
Esta carta publicada por Eduardo Bolsonaro, filho do Presidente Brasileiro e deputado federal, chega depois de, na sexta-feira, 10 de Junho, o Serviço de Investigação Criminal da Polícia Nacional de Angola (SIC) ter desenvolvido acções de busca e apreensão contra pastores da IURD por suspeita de evasão de divisas e de lavagem de dinheiro. Os templos religiosos também foram alvo dos mandados judiciais do SIC.
De lembrar que um grupo de fiéis e pastores brasileiros da Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) tentaram tomar, pela força, a Catedral do Morro Bento, na Avenida 21 de Janeiro, em Luanda, no dia 24 de Junho.
Durante a tentativa de tomada, à força, do templo, houve resistência da parte angolana que não aceitou abandonar o local, chamando a Polícia Nacional (PN), assim como efectivos da SIC, que em pouco tempo chegaram ao local para manter à ordem e a tranquilidade pública, e evitar que o pior acontecesse.
Segundo o porta-voz do Comando Provincial de Luanda da Polícia Nacional, inspector-chefe Nestor Goubel, tanto a parte brasileira como a parte angolana foram encaminhados para a 21.º esquadra, no Rocha Pinto, para prestarem declarações, como avançou o Novo Jornal.
“Eles não estão detidos, apenas convidamos os jovens e os pastores brasileiros, assim como os angolanos, a depor em função do sucedido durante a madrugada. Tão logo termine o depoimento, o caso será entregue ao Ministério Público”, disse, na altura, Nestor Goubel, ao Novo Jornal.
O porta-voz da PN em Luanda assegurou que as autoridades estão a acompanhar toda a situação da Igreja Universal do Reino de Deus mas caberá aos tribunais decidirem a problemática que a IURD esta a viver.
Na segunda-feira, 22 de Junho, um movimento de bispos e pastores da Igreja Universal do Reino de Deus tomaram 30 templos em seis províncias do País, designadamente Benguela, Kwanza-Sul, Huambo, Malanje e Namibe.
Sob liderança do bispo Valente Bezerra, os pastores angolanos decidiram romper com a representação brasileira em Angola, encabeçada pelo bispo Honorilton Gonçalves, a quem acusam de uma série de irregularidades.
O movimento reivindicativo diz-se pronto para iniciar as reformas na igreja e não aceita ser conotada com dissidência nem o rótulo de “ex-pastores”, como os brasileiros pretendem fazer passar junto da opinião pública.
“A Comissão Instaladora da Igreja Universal do Reino de Deus Reformada em Angola, continua a testemunhar actos de discriminação racial, castração, abortos forçados às esposas dos pastores angolanos e usurpação das competências da assembleia-geral de pastores”, disse ao Jornal de Angola, o pastor Agostinho Martins da Silva, porta-voz da referida denominação.
Estas acusações juntam-se às de fuga de divisas para o estrangeiro, acusação que já remonta a 2016, como o Novo Jornal noticiou na altura, quando um ex-bispo desta igreja, Alfredo Paulo, fez severas acusações à liderança da IURD em Angola.
Situação é tensa desde 2016
Entretanto, segundo o porta-voz dos 300 pastores angolanos, a Comissão Instaladora decidiu montar o seu “Estado-Maior” na Catedral do Morro Bento, localizada na Avenida 21 de Janeiro, em Luanda.
O abuso de confiança na gestão financeira, assim como as irregularidades no pagamento da segurança social aos pastores e privação de visitas aos familiares, estão igualmente na base desta rotura com os pastores brasileiros.
De recordar que, em Novembro do ano passado, os bispos e pastores da Igreja Universal do Reino de Deus em Angola anunciaram, em Luanda, a rotura com o bispo Edir Macedo, por, alegadamente, este ter desenvolvido práticas doutrinais contrárias.
Num comunicado assinado por mais de 300 bispos e pastores angolanos, estes contaram, na ocasião, que a liderança brasileira, por orientação de Edir Macedo, passou a forçar os pastores angolanos a submeterem-se ao procedimento cirúrgico de “esterilização”, tecnicamente conhecido como vasectomia.
Esta prática viola, de acordo com os contestatários, de forma grave, os direitos humanos, de acordo com a Constituição da República de Angola.
Os bispos e pastores angolanos acrescentam que, além disso, a liderança brasileira tem promovido a evasão de divisas para o exterior do País.
No mesmo mês, o director de Gabinete de Comunicação Institucional e Imprensa do Ministério do Interior, subcomissário Waldemar José, disse que uma comissão formada por representantes dos ministérios do Interior, da Cultura e da Justiça e Direitos Humanos estavam acompanhar as investigações na IURD e que a mesma se encontrava sob sigilo.
Apesar disso, Waldemar José, afirmou que “todos os indícios probatórios estão a ser investigados e isso vai permitir que seja determinada a relação criminal entre todos os envolvidos. Caso as denúncias sejam comprovadas, os responsáveis, individualmente ou até mesmo colectivamente, serão legalmente responsabilizados”.