Tribunais moçambicanos anularam diversas votações em Moçambique. Analistas dizem que este é o reconhecimento das queixas da oposição de que houve fraude nas eleições autárquicas de 11 de outubro.
A “guerra” dos resultados eleitorais continua a agitar Moçambique.
A oposição insiste que houve uma série de irregularidades nas autárquicas de 11 de outubro. A Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) diz que os resultados intermédios anunciados pelos órgãos eleitorais, que lhe dão a vitória na maioria das autarquias, são fruto do “trabalho árduo” no contacto com os eleitores.
Mas vários tribunais têm dado razão à oposição. Depois dos tribunais judiciais de Cuamba e Chókwe decidirem anular a votação nestas autarquias, foram anuladas as eleições no distrito urbano de Kampfumo, em Maputo, e em mais de 60 mesas no distrito municipal de Nlhamankulu. Os tribunais citam irregularidades que “afetam a transparência” do processo, incluindo editais e atas falsos.
Na cidade de Nampula, um tribunal pediu a recontagem dos votos em duas assembleias.
“Estas decisões confirmam a tamanha ilicitude que caraterizou estas eleições”, advoga o pesquisador moçambicano José Malaire. Por outro lado, as anulações dos resultados “mostram a funcionalidade dos tribunais e resgatam alguma credibilidade aos órgãos do Estado”, acrescenta.
O pesquisador admite também que esta pode ser uma resposta dos tribunais à onda de contestação das eleições autárquicas. Na terça-feira (17.10), milhares de pessoas protestaram em Moçambique contra a fraude eleitoral e em apoio do maior partido da oposição, a Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO).
Justiça “pode fazer mais”
O politólogo Ricardo Raboco salienta que as decisões para a anulação da votação em várias autarquias são encorajadoras e arrojadas.
“É uma demonstração de que o terceiro pilar do Estado [o poder judicial] está a ser imparcial. E está a dar um aviso claro de que pode fazer mais”, disse Raboco em declarações à DW.
A comissão eleitoral de Gaza anunciou, entretanto, que vai recorrer da anulação das eleições em Chókwe, depois de uma sentença que considerou “injusta”.
Na Matola, a juíza bateu no martelo para dizer que não dá provimento ao recurso da RENAMO. Em causa está a alegada falta de autenticação das atas e editais. Em Marracuene e Nacala-Porto, os recursos da RENAMO caíram por terra nos tribunais locais, supostamente por meras tecnicidades.
Também em Quelimane, o recurso da “perdiz” foi “chumbado”, mas o partido promete recorrer ao Conselho Constitucional.
Repetição das eleições
Para o pesquisador José Malaire, as decisões dos tribunais, que provam que houve fraude, são um “atestado de incompetência” aos órgãos eleitorais: “Os órgãos eleitorais não existem. O Secretariado de Administração Eleitoral (STAE) e a Comissão Nacional de Eleições (CNE) não são instituições credíveis”, afirma.
A CNE prometeu investigar todas as denúncias de ilícitos eleitorais.
A repetição ou não das eleições nas regiões onde houve decisão de anulação dependerá da decisão do Conselho Constitucional.
Ricardo Raboco acredita na “idoneidade, maturidade e ponderação” deste órgão. De acordo com o politólogo, mesmo no caso da cidade de Quelimane, ainda “há esperança” para a RENAMO ver a sua reclamação atendida favoravelmente.