Centrais sindicais angolanas denunciam atos de coação e a detenção de três sindicalistas na primeira greve geral desde a independência do país. Governo diz que está aberto ao diálogo
Trabalhadores dos setores da educação, saúde, transportes, justiça e até da administração pública ficaram em casa, esta quarta-feira (20.03). Exigem aumentos salariais e a redução do Imposto sobre o Rendimento de Trabalho (IRT) para contornar o aumento do custo de vida.
Esta manhã, à entrada da Maternidade Lucrécia Paim, em Luanda, a principal do país, dois cartazes anunciavam a greve. Havia uma enchente no banco de urgência, pois 50% dos trabalhadores aderiram à paralisação. Todos os serviços administrativos do hospital encerraram.
“Estou doente e ainda não fui atendida. É só dinheiro perdido no táxi”, queixou-se a paciente Emília Salumbongo.
A diretora interina da Maternidade Lucrécia Paim, Julieta de Castro, garante que a greve não prejudicou o funcionamento do hospital.
“Podemos dizer que o trabalho está a decorrer no ritmo normal. As urgências e os blocos operatórios estão a funcionar normalmente”, afirmou em declarações à DW África. “Nos internamentos também temos colegas a trabalharem nos seus respetivos serviços”, acrescentou.
Só certidões de óbito
Esta quarta-feira, no Serviço de Registos e Notariado, não havia a enchente de outros dias. Durante os três dias de greve geral, só serão emitidas certidões de óbito.
“Isso é um grande transtorno para a população angolana”, lamentou o utente Gilson Filipe, “porque a essa hora tem muita gente atrás da sua documentação e as pessoas não conseguem tratar dos seus assuntos por causa desta dificuldade”.
“Mesmo que estejam a reivindicar um salário mais alto, que atendam a população! O salário deles não pode prejudicar a população”, apelou.
Denúncias de coação e detenções
A primeira fase da greve termina na sexta-feira, 22 de março. As centrais sindicais fazem um balanço positivo do primeiro dia, estimando uma adesão na ordem dos 95% a nível nacional.
Mas os sindicatos denunciam também a detenção de três grevistas nas províncias do Bengo e do Huambo.
“As centrais sindicais reservam-se ao direito de intentar ações judiciais contra os agentes da polícia nacional e os gestores das unidades hospitalares por violação da lei da greve nos termos do artigo 25 e 26, e apela à libertação incondicional dos sindicalistas […] sob pena de desencadear manifestações públicas a nível nacional”, ameaçou Teixeira Cândido, secretário-geral do Sindicato dos Jornalistas Angolanos, ao ler o comunicado das centrais sindicais.
Os sindicalistas denunciam ainda atos de coação contra delegados da Justiça, supostamente por parte do Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, “através de orientação superior distribuída por mensagem via WhatsApp”.
No entanto, o Governo refere que continua aberto ao diálogo com os sindicatos e apela à “flexibilidade”.
Para além dos funcionários públicos, prevê-se que os operadores de táxi paralisem os trabalhos na próxima semana. O setor público da comunicação social também deverá aderir a uma segunda fase da greve, caso não haja consenso entre o Governo e os sindicatos.