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Segunda-feira, Novembro 25, 2024

Cientistas reactivam células no cérebro de porcos mortos

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Pesquisadores injectaram sangue artificial em órgãos e conseguiram restaurar actividades de algumas células; cientistas ressaltam que os cérebros não voltaram à vida.

Cientistas conseguiram restaurar certas actividades celulares no cérebro de porcos que já estavam mortos há quatro horas. Entretanto, o estudo publicado nesta quarta-feira (17) na revista “Nature” indica que não foi detectada “nenhuma actividade eléctrica que implicaria um fenómeno de consciência ou percepção”.

De acordo com o pesquisador Nenad Sestan, da Escola de Medicina de Yale, pelos padrões médicos, não se tratava de um cérebro que voltou à vida.

“Não são cérebros vivos, mas cérebros cujas células estão activas”, Nenad Sestan – Yale
No entanto, o trabalho revelou um grau surpreendente de resiliência nas células dentro de um cérebro que já tinha perdido o fornecimento de sangue e oxigénio. “A morte da célula no cérebro ocorre durante uma janela de tempo mais longa do que pensávamos anteriormente”, disse Sestan.

Ainda segundo Sestan, os trabalhos demonstram que “subestimamos a capacidade de restauração celular do cérebro”.

Injecção de sangue artificial
A pesquisa usou 32 cérebros de porcos que haviam sido mortos em um matadouro para servirem de alimento. Os cérebros foram então levados ao laboratório e colocados dentro de um aparelho baptizado de BrainEx. Os cientistas irrigaram alguns dos cérebros durante seis horas com um produto substituto de sangue. Esse líquido foi concebido para oxigenar os tecidos e protegê-los da degradação derivada da interrupção do fluxo sanguíneo.

Os resultados foram surpreendentes: diminuição da destruição das células cerebrais, preservação das funções circulatórias e, inclusive, restauração de uma actividade sináptica (sinais eléctricos ou químicos na zona de contacto entre neurónios).

Os cérebros não mostraram nenhuma actividade eléctrica de larga escala, o que indiciaria que poderiam estar conscientes. Mas restaurar a consciência não era o objectivo do estudo, que visava explorar se funções específicas poderiam ser restauradas horas após a morte.

Depois das seis horas de injecção do sangue artificial, cientistas descobriram que algumas células individuais do cérebro haviam mantido detalhes considerados chave para sua estrutura, enquanto células de cérebros que não foram tratados já tinham se degradado de forma severa.

Neurónios viáveis após o estímulo
Na etapa seguinte do estudo, os cientistas removeram os neurónios dos cérebros tratados e os submeteram a estímulos eléctricos. Segundo eles, essas células responderam de uma forma que indicava a viabilidade.

Além disso, estudando o sangue artificial antes de ele ser injectado nos cérebros, e depois de ele ter circulado, os cientistas encontraram evidências de que as células cerebrais estavam absorvendo o açúcar e oxigénio do sangue, além de estarem produzindo dióxido de carbono, um sinal de que estavam de fato funcionando.

Outro resultado obtido no estudo é que os vasos sanguíneos nos cérebros tratados responderam a medicamentos que dilatam vasos.

Possíveis desdobramentos
Os pesquisadores afirmaram que pesquisas como essa podem levar a novas terapias de tratamento de um acidente vascular encefálico ou outras condições médicas, além de oferecer uma nova maneira de estudar o cérebro e como os medicamentos o afetam.

Segundo eles, não há actualmente qualquer plano de tentar repetir a mesma técnica em cérebros humanos.

A pesquisa foi financiada principalmente pelo Instituto Nacional de Saúde dos Estados Unidos.

O cérebro pode voltar a ter funções normais após a morte?
De acordo com Sestan, os pesquisadores não fizeram o estudo com esse objectivo, e não sabem se seriam capazes de restaurar as funções normais de um cérebro caso decidam tentar.

Co-autor do estudo, Stephen Latham, da Universidade Yale, ressaltou que, se esse tipo de consciência tivesse aparecido nos experimentos, os cientistas teriam usado anestesia e baixas temperaturas para apagá-la, além de interromperem o experimento. Segundo Latham, não existe um consenso ético bom o suficiente sobre realizar experiências como essa em um cérebro consciente.
A próxima etapa da pesquisa é descobrir se os cientistas conseguem manter as funções cerebrais que foram observadas por mais de seis horas de tratamento. Para isso, Latham explica que seria necessário usar a tecnologia como uma ferramenta de pesquisa.

Contribuição ao conhecimento
Os resultados repercutiram na comunidade científica. Christof Koch, presidente do Instituto Allen de Ciências do Cérebro, em Seattle, não participou do estudo, mas afirmou ter se surpreendido com os resultado, especialmente porque eles foram obtidos com um animal de grande porte.

“Esse tipo de tecnologia poderia ajudar a aumentar o nosso conhecimento sobre como trazer pessoas de volta à terra dos vivos”, explicou ele, citando como exemplos casos de uma overdose de drogas ou um evento catastrófico que corte o oxigénio do cérebro de uma pessoa por uma ou duas horas. Mas, ao contrário do experimento nos porcos, qualquer tipo de tratamento nesse sentido não seria feito ao remover o cérebro do corpo humano.

Campo minado da ética
O trabalho com os porcos também entra no que Koch chamou de um campo minado da ética. Primeiramente, porque pode questionar uma definição já amplamente aceita sobre a morte, como sendo a perda irreversível da função cerebral.

Isso porque a irreversibilidade “depende do estado da tecnologia e, como mostra esse estudo, ela está avançando constantemente”.

Em segundo lugar, o experimento abre caminho para que alguém um dia possa tentar a mesma coisa com um cérebro humano.

Se experimentos futuros conseguirem restaurar actividades eléctricas em larga escala, isso indicaria consciência? “[O cérebro] experimentaria confusão, desilusão, dor ou agonia?”, questionou ele, afirmando que seria inaceitável mesmo no cérebro de um animal.

A revista “Nature” publicou também comentários de dois profissionais que trabalham na área da bioética. Stuart Youngner e Insoo Hyun, da Escola de Medicina Case Western Reserve, em Cleveland, afirmaram que, se um trabalho como esse leva a métodos melhorados de ressuscitar o cérebro das pessoas, ele pode complicar decisões sobre quando é permitido retirar órgãos para transplantes.

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