Juristas dizem não haver “obrigatoriedade” no cumprimento do acórdão que mandou colocar enviado especial da Venezuela em prisão preventiva
O acórdão do Tribunal da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) que determina ao Estado de Cabo Verde que coloque em prisão domiciliária o empresário colombiano e enviado especial da Venezuela, Alex Saab, que se encontra detido desde 12 de junho, pode não ser executado.
A opinião é de juristas cabo-verdianos que apontam para a falta de uma estrutura para fazer cumprir as decisões daquele tribunal no país e o facto dos tribunais nacionais não dependerem hierarquicamente do Tribunal da CEDEAO.
A antiga bastonária da Ordem dos Advogados, Sofia Oliveira Lima, considera que não existe nada em concreto que obriga as autoridades cabo-verdianas a acatarem a decisão do Tribunal da CEDEAO, embora, como membro do órgão e com um juiz colocado naquela estrutura judicial sub-regional, elas devem seguir o acórdão do tribunal.
Por outro lado, refere a advogada, por ser tratar de uma questão de ordem humanitária, “seria de bom senso as autoridades nacionais aplicarem a medida tomada”.
“Quando os Estados aderem às organizações internacionais, eles assumem os compromissos de executar as suas decisões”, afirma Lima.
A advogada acrescenta ainda que o Tribunal da CEDEAO tem vindo a sugerir que os Estados membros criem uma entidade para fazer cumprir localmente as suas decisões, mas ” Cabo Verde não tem essa entidade”.
Para o jurista e professor universitário João Santos, o cumprimento da decisão do tribunal comunitário dependerá da análise que as instâncias judiciais nacionais fizerem, uma vez que se evoca razões de cariz humanitário, e nunca na perspectiva de obrigatoriedade tendo em conta que “os nossos tribunais não dependem hierarquicamente da estrutura judicial da CEDEAO”.
Entretanto, como disse na quinta-feira, 3, à VOA um dos advogados de defesa de Alex Saab, aguarda-se que as autoridades de Cabo Verde acatem a decisão do Tribunal num caso que se arrasta há muito tempo e que tem a haver com questões humanitárias.
João do Rosário disse esperar “o cumprimento imediato da decisão” para que Saab possa “em melhores condições aguardar serenamente pelo desfecho do processo”, que voltará a ser analisado no Tribunal da Comarca de Barlavento conforme instruções do Supremo Tribunal de Justiça (STJ).
Não houve ainda qualquer pronunciamento do Governo ou da Procuradoria-Geral da República.
O caso
Detido a 12 de junho no Aeroporto Internacional Amílcar Cabral, na ilha do Sal, num voo privado a caminho do Irão, Saab viu o Tribunal da Comarca de Barlavento autorizar a sua extradição para os Estados Unidos a 31 de julho.
A justiça americana, que pediu a sua detenção e extradição, diz que Saab é um testa-de-ferro do Presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, e o acusa de lavagem de capitais no montante de 350 milhões de dólares através do sistema financeiro dos Estados Unidos.
O Governo da Venezuela afirma que ele tem imunidade diplomática e que estava a serviço do país, enquanto a defesa também já recorreu à Comissão dos Direitos Humanos das Nações Unidas e ao Tribunal da Cedeao.
O STJ de Cabo Verde negou três habeas corpus.