As estrelas ainda nem haviam subido ao palco, em plena tarde deste domingo, quando milhares de angolanos começaram a viver, com ansiedade, o show “3 G do Semba”.
Transmitido em directo pela Televisão Pública de Angola e em várias plataformas digitais, o concerto quase “paralisou” o país, agitando, por várias horas, as redes sociais.
O show live centralizou a atenção dos amantes do semba, numa tarde solidária a favor da Fundação Ana Carolina, em busca de apoios para as vítimas de paralisia cerebral.
Com três gerações enraizadas no semba, o concerto foi intenso, atravessou fronteiras e uniu os angolanos radicados na terra Pátria aos milhares espalhados pela diáspora.
Neste domingo, o semba esteve em alta, nas vozes de Bonga, Paulo Flores e Yuri da Cunha, três dos mais notáveis artistas nacionais, que retrataram Angola, nas suas múltiplas etapas, ante um contexto de temor e incertezas, por causa da Covid-19.
Foi, na essência, um concerto de alto nível técnico: vibrante, contagiante, mas, acima de tudo, de passagem de testemunho entre três estrelas de gerações distintas.
Com um guião repleto de grandes temas de sucesso, o show “3 G do Semba” uniu, num só palco, artistas de Angola, da Guiné Bissau e de outras paragens do Mundo.
A actuação do trio simbolizou um momento de exaltação ao patriotismo e resgate da identidade cultural, valores bem vincados em cada uma das canções interpretadas.
Foram, ao todo, 30 músicas, produzidas no período de 1970 a 2018, cantadas com vivacidade, criatividade, sentimentalismo e alma, a ama de verdadeiras estrelas.
A actuação do trio já indiciava “estremecer” o país mesmo antes do “dia D”, sendo tema de conversas entre os amantes do semba, que prognosticavam fortes emoções.
Diante da expectativa do povo, Bonga, Paulo Flores e Yuri da Cunha tinham a dura missão de abrir uma nova página na história, unindo uma Nação, por via da música.
E foi, exactamente, isso que fizeram, com os seus timbres vocais, a sua veia criativa, as suas melodias e letras imortalizadas pelo tempo, enfim, com o seu inigualável talento.
Com esse show solidário, a tarde de 28 de Junho entrou para a história do cancioneiro angolano.
Em termos gerais, o concerto teve de tudo um pouco: emoção, afecto e grande empatia entre músicos, instrumentistas e um povo que, à distância, se rendeu às estrelas.
Velhos, jovens e adolescentes assistiram, este domingo, um momento memorável, de criatividade pura, de irmandade, fraternidade e solidariedade aos necessitados.
O concerto, que continua a agitar as redes sociais, abriu em ritmo lento, ao som de “Ilia”, do álbum “Bonga – Raízes”, na voz de Bonga, com participação de Paulo Flores.
Logo a seguir, foi a vez de Yuri da Cunha, interpretando “Obrigado Bonga Kwenda”, “Kandengue Atrevido” e “Kiteke”, no primeiro tributo ao mais experiente do trio.
Já com milhares de telespectadores “rendidos” ao talento dos protagonistas da tarde, com mensagens de reconhecimento nas redes sociais, Paulo Flores elevou a fasquia do concerto, com os temas “Coisas da Terra”, “Coração Farrapo” e “Reencontro”.
Num ambiente de descontracção e entrosamento entre os artistas e a banda, liderada por Betinho Feijó (ritmo), Ximbinha (ritmo), Manecas Costa (solo) e Carlitos Chiemba (baixo), Bonga encerrou o primeiro bloco do guião, ao som de “Marimbondo”.
Era chegado o momento para explicar as razões da realização do concerto, assumido, em breves palavras, por Paulo Flores, antes de interpretar “20 Anos”, com Yuri da Cunha.
O segundo bloco começou em alta, com “Água Rara”, na voz de Bonga, “Cabo Ledo”, com Paulo Flores, e “Kamacove”, Bonga, no primeiro momento de “explosão”.
Estava criado o ambiente para Yuri da Cunha recordar um velho amigo do cancioneiro angolano (Man-Ré), com o tema “E tudo Mudou”, antes de acelerar o ritmo e mandar para o palco “Homem é Bom”, levando Bonga a um momento de inspiração.
Ante à actuação de Yuri, Bonga experimentou passos de dança e pôs à prova, pela primeira vez, a sua versatilidade, tomando “de assalto” os tambores.
Logo a seguir, voltou aos microfones Paulo Flores, ao ritmo de “Minha Velha”.
“Como já disse uma vez, tem músicas que a gente faz e tem músicas que fazem a gente”, exprimiu, antes de dedicar a canção à sua mãe e à sua avó.
Na mesma cadência melódica, Bonga voltou aos microfones e interpretou “Olhos Molhados”, com Paulo Flores, num momento de nostalgia.
“Tenho uma lágrima no canto do olho (bis). Se um dia mais, se um dia ao menos, pudessem ver e ter, na corrida p’ra o poder, primeiro é o pão para se comer”, interpretou o músico.
Seguiu-se “Kaxexe”, também na voz de Bonga, numa altura em que se evidenciavam a guitarra ritmo de Betinho Feijó e o solo de Manecas Costa (Guiné Bissau).
Com esse ambiente, Yuri da Cunha recordou um velho sucesso de Euclides da Lomba “Regressa”, preparando cenário para Bonga mandar para o palco “Mulemba Xangola”,
Atento ao desempenho do mais jovem dos intérpretes, Bonga evidenciou-se na dikanza, nos tambores e na puita, antes de convidar Yuri para um momento de improviso vocal.
“Yuri, gostei. Gostei muito”, expressou, emocionado, o artista, que logo a seguir voltou a acelerar o ritmo com outro dos seus grandes sucessos “Kambuá”.
O show já ia a meio, quando a banda tocou “Njila Ia Dikanza”, de Paulo Flores, em dueto com Yuri da Cunha, criando ambiente para um momento de homenagem.
O momento a seguir foi de tributo a Teta Lando, nas vozes de Paulo Flores e Yuri da Cunha, que cantaram “Eu Vou Voltar”, ante o solo contagiante de Manecas Costa.
Seguiu-se uma rapsódia de Teta Lando, com “Angola Segue em Frente” e “Tata Nkento”, num dos momentos mais altos da tarde, em que a dupla exaltou o patriotismo.
O derradeiro bloco abriu com “Meus Cabelos Brancos”, na voz de Yuri da Cunha, seguido de “Rumba Zatukina”, de David Zé, nas vozes de Yuri da Cunha e Paulo Flores, com ligeira passagem por “Saudades”, de Eduardo Paim
“Sinto-me um kota realizado ao pé desses amigos. É muitíssimo bom, é bonito. E ainda bem que assim aconteceu”, expressou Bonga, antes de cantar “Diakandumba”.
O show já ia na reta final, quando Yuri da Cunha interpretou “Macumba”, seguido de Paulo Flores, ao som de “Inocente”, um dos seus maiores sucessos na década de 90.
Mas, antes do “assalto final”, um momento de descontracção, com Bonga, ao som de “Mona Ki Ngi Xica”, com auxílio de Paulo Flores.
“Para nós é um sonho estar aqui com o kota (mais velho)”, expressou Paulo Flores, a que Bonga respondeu de pronto “Eu sou aceito aquilo que eu gosto”.
Estava criado o cenário propício para o trio acabar em força uma actuação que vai ficar para a posteridade, primeiro com “Poema do Semba”, parceria entre Paulo e Bonga, e, depois, com uma rapsódia de temas de sucesso dos três protagonistas de outros artistas.
“Só quem não tem sentimento, não entende esse momento”, exprimiu Paulo Flores, antes de mandar para o palco “O Povo”, “Mariana” e “Ngana”, esta última da Banda Maravilha.
Seguiu-se Bonga, num momento de descontracção com a gaita. Para fechar, Yuri cantou “Kuma Kuakie”, dando ao Carlitos Chiemba a chance de brilhar na viola baixo.
O concerto solidário encerrou-se ao cair da tarde, ao som de “Jingonça”, na voz da Bonga, num autêntico brinde à lusofonia e à cultura angolana.
É esse, em síntese, o resumo que se lê nas redes sociais, volvidas algumas horas desde a actuação do trio do semba, num show em que participaram, além de Betinho Feijo, Ximbinha, Manecas Costa e Carlitos Chiemba, os instrumentistas Kiary Flores, Galiano (congas), Ciro Bertini (acordeão), Gildo Umba (baterial), Mayo (baixo), entre outros.