Ronnie Lessa e Élcio Queiroz, acusados de serem os executores do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) e de seu motorista, Anderson Gomes, foram condenados, nesta quinta-feira (31), a 78 e 59 anos de prisão, respectivamente, ao final de um julgamento que durou dois dias.
“A justiça por vezes é lenta, cega, burra, mas chega”, disse a juíza Lúcia Glioche após receber a decisão do júri popular, que ouviu na véspera vários depoimentos, entre eles os dos assassinos confessos.
Após ouvirem a sentença, familiares de Marielle e Anderson se abraçaram e choraram na sala do tribunal, no Rio de Janeiro.
“A gente segue a luta (…) para derrotar o que assassinou a Marielle, que é essa violência do Rio de Janeiro. Que é essa violência política, pelo fato de ser uma mulher negra, favelada. Os seus assassinos acharam que seu corpo era descartável”, declarou Mônica Benício, viúva de Marielle e hoje vereadora.
O Ministério Público havia pedido a pena máxima, de 84 anos, para os ex-policiais militares Lessa e Queiroz. Lessa, que admitiu ter metralhado Marielle de dentro de um veículo dirigido por Queiroz, foi condenado a 78 anos e 9 meses, e seu cúmplice, a 59 anos e 8 meses.
Durante seu depoimento de ontem, que aconteceu por videoconferência da prisão, Lessa disse que ficou “cego” e “louco” com a oferta milionária que recebeu para executar o assassinato, supostamente motivado pela luta da vereadora contra o crime organizado no Rio de Janeiro.
Nas alegações finais de hoje, os promotores questionaram a sinceridade de Lessa, ressaltando que ele e Queiroz negaram os fatos até as provas os deixarem em evidência, e então buscaram uma saída, “que foi a delação”.
Devido a esse acordo, cujos termos ainda estão sob sigilo, a pena efetiva será reduzida, explicaram à AFP fontes judiciais.
De acordo com o G1, Lessa cumprirá 13 anos de prisão e Queiroz, sete, que se somam aos já cumpridos desde 2019.
– ‘Tinha esperança de que estivesse viva’ –
Estavam presentes na sala do tribunal durante as audiências a mãe, a filha, a viúva e a irmã de Marielle, além da viúva de Anderson Gomes. Junto ao júri, eles ouviram ontem depoimentos fortes, como o de Fernanda Chaves, assessora de imprensa de Marielle, que estava no carro da vereadora e sobreviveu ao atentado.
Por videoconferência, ela relatou as circunstâncias do ataque. Disse que ouviu uma “rajada” de tiros e que se agachou, pensando que se tratava de “um confronto de policiais e bandidos”. “Eu estava atrás do Anderson, ao lado da Marielle. Ela estava o tempo todo da viagem do meu lado direito, de onde vieram os tiros”, contou Fernanda.
Quando os tiros cessaram, ela conseguiu acionar o freio de mão, saiu do veículo, “muito ensaguentada […] e com vidro grudado” em seu corpo, para pedir ajuda. “Olhei para Marielle lá dentro, na esperança de que ela ainda estivesse viva”.
O julgamento não incluiu os supostos autores intelectuais do crime, o deputado federal Chiquinho Brazão (sem partido-RJ) e seu irmão, Domingos Brazão, conselheiro do Tribunal de Contas do Rio (TCE-RJ). Presos em março, após terem sido citados em delação por Ronnie Lessa, os irmãos Brazão se apresentaram na semana passada para depor no Supremo Tribunal Federal (STF), assim como o ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro Rivaldo Barbosa.
Os irmãos Brazão e Rivaldo Barbosa, acusado de obstruir a investigação após o assassinato, negaram envolvimento no crime. As investigações estão em curso.
“Quem mandou [matar], mandou por uma questão financeira, porque tinha interesse em calar a voz da Marielle”, afirmou hoje o promotor Fabio Vieira.
Após a decisão, o pai de Marielle, Antônio Silva, ressaltou que, embora a condenação traga algum “sossego”, “não acaba aqui, porque tem os mandantes” do crime.