A Polícia Federal prendeu o ex-jogador de futebol Robinho no início da noite da quinta-feira (21/2). O ex-atleta foi preso no prédio onde mora, em Santos, no litoral de São Paulo.
O mandado de prisão contra Robinho foi emitido pela Justiça Federal em Santos após o Supremo Tribunal Federal (STF) negar o último recurso da defesa do ex-atleta.
Robinho deve cumprir no Brasil a pena de prisão por estupro coletivo, proferida pela justiça italiana em 2017.
Robinho foi condenado na Itália a nove anos de prisão pelo estupro de uma mulher junto com outros homens em uma boate em Milão em 2013.
O ex-jogador estava no Brasil quando todas as possibilidades de recurso se esgotaram na Justiça italiana, no ano passado.
Como a legislação do Brasil não permite a extradição de cidadãos brasileiros, o governo italiano pediu que ele cumprisse sua pena por aqui.
Na quarta-feira, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) acatou o pedido por nove votos a dois e determinou o início imediato do cumprimento da pena em regime fechado.
A defesa de Robinho recorreu da decisão no STF, mas o recurso foi negado pelo ministro Luiz Fux.
O caso de Robinho foi a julgamento no STJ pouco tempo depois de outro jogador de futebol brasileiro de renome internacional, Daniel Alves, ser condenado à prisão por estupro.
No início do julgamento da quarta, o advogado José Eduardo Rangel de Alckmin, responsável pela defesa do ex-jogador, pediu que, em vez do cumprimento da pena determinada pela Justiça italiana, o Brasil julgue aqui o crime cometido na Europa.
“Isso não representa de forma alguma impunidade. Ele terá direito, como qualquer brasileiro, a responder na Justiça brasileira pelos atos imputados”, defendeu.
A condenação de Robinho por estupro
Robinho, ex-jogador da seleção brasileira, foi condenado na Itália por ter abusado sexualmente de uma jovem albanesa em uma boate de Milão em conjunto com outros cinco homens em 2013.
Na época, ele jogava pelo Milan, um dos principais times da cidade italiana.
A vítima tinha 23 anos na época e não teve o nome divulgado no processo.
O jogador negou as acusações, mas escutas feitas em seu carro, autorizadas e confirmadas pela Justiça italiana, validaram a versão da vítima, segundo disse uma das juízas ao longo do processo.
Em uma das gravações, divulgadas pelo site Globoesporte.com em 2020, o jogador diz: “Estou rindo, porque não estou nem aí, a mulher estava completamente bêbada, não sabe nem o que aconteceu”.
A sentença foi confirmada em outras instâncias e deixou de ter possibilidade de recurso em janeiro de 2023, quando foi confirmada definitivamente pela Justiça italiana. No jargão jurídico, a decisão transitou em julgado.
Robinho disse nas redes sociais que a Justiça italiana “cometeu erros gritantes e gravíssimos” no julgamento e negou que tenha havido estupro.
O ex-jogador também disse ser vítima de racismo. “Tenho absoluta certeza que se fosse com um europeu, se fosse com um branco, com certeza meu julgamento teria sido totalmente diferente.”
Em uma entrevista na TV também no domingo, o ex-jogador disse que seu caso é “totalmente diferente” do caso de Daniel Alves, que foi condenado a quatro anos e meio de prisão por estuprar uma jovem no banheiro de uma boate na Espanha em 2022.
“Pelo pouco que vi, a vítima foi buscar seus direitos logo após. No meu caso, a mulher que me acusou foi depois de quatro meses procurar a Justiça”, disse Robinho à emissora Record.
A Itália chegou a pedir a extradição do jogador para a Europa. Mas a Constituição do Brasil não permite que cidadãos do país sejam extraditados.
Foi emitido então, em fevereiro de 2023, um pedido de prisão internacional do jogador. Isso significa que, caso saia do Brasil, ele pode ser preso e enviado para a Itália.
O governo italiano também solicitou ao Ministério da Justiça brasileiro a homologação da sentença.
Ou seja, que a condenação fosse reconhecida pela Justiça brasileira e que a pena fosse cumprida no Brasil.
O pedido foi encaminhado pelo ministério ao STJ, a quem compete analisar casos assim, que acatou a demanda.
Como foi o julgamento
O relator do caso, o ministro Francisco Falcão, fez a leitura de seu voto a favor do cumprimento da pena no Brasil, porque apontou que o caso cumpre todas as medidas recomendadas pela legislação brasileira para isso.
Para que a transferência da execução de uma pena seja aceita, são necessários alguns requisitos previstos na Lei de Imigração:
ser cidadão brasileiro ou residente no Brasil;
ser uma decisão final (trânsito em julgado);
pena maior que 1 ano;
a atitude também deve ser considerada crime também no Brasil;
haver tratado ou promessa de reciprocidade (significando que a Itália se compromete a executar uma pena a italiano condenado no Brasil).
O MPF disse que o caso de Robinho cumpre tais requisitos e citou o entendimento de Davi Tangerino, professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, que defende que a Lei de Imigração não impede que o brasileiro seja submetido à execução de pena privativa de liberdade estrangeira.
O MPF também defendeu que a medida está de acordo com os direitos constitucionais e afirmou que aceitar os argumentos de Robinho levaria à “impunidade”.
A maioria dos ministros do STJ concordou com essa visão.
Falcão afirmou que a extradição de Robinho é inviável — o que resta é a “execução de pena” no Brasil.
“Diante da negativa de extradição”, disse Falcão, “o compromisso do Brasil com o governo da Itália é a transferência da execução” para que Robinho cumpra a pena no Brasil.
Caso contrário, apontou Falcão, o Estado brasileiro estaria colaborando para a impunidade do caso, que segundo ele cumpriu todos os procedimentos corretos na justiça italiana.
O relator reforçou que “defender que não se cumpra” a pena no Brasil “é o mesmo que defender a impunidade do requerido, o que não se pode admitir”, principalmente com base em acordos internacionais.
Ainda que passasse por um novo processo, julgamento e condenação no Brasil, segundo Falcão, Robinho ainda precisaria cumprir a pena italiana.
Se não ocorrer a homologação da pena italiana, afirmou o relator, a vítima do estupro terá a sua “dignidade novamente ultrajada”, em razão da impunidade.
Ao concluir o voto pela homologação da sentença italiana, o relator pediu urgência para a Justiça Federal de Santos na execução da pena de Robinho, que deverá ser inicialmente em regime fechado.
O voto do relator foi acompanhado pelos ministros Humberto Martins, Herman Benjamin, Luís Felipe Salomão, Mauro Campbell Marques, Isabel Gallotti, Ricardo Villas Boas, Antonio Carlos Ferreira e Sebastião Reis.
Já o ministro Raul Araújo se manifestou contra a homologação da pena italiana no Brasil. Ele afirmou que não estava discutindo sobre o crime em si, mas sim sobre o cumprimento da condenação italiana em solo brasileiro.
Araújo argumentou que o pedido da justiça italiana não pode ser atendido no Brasil por ausência de requisitos legais. Segundo ele, isso não significa impunidade, pois aponta que o caso deve ser processado e julgado no Brasil.
Durante o debate sobre o cumprimento da punição estrangeira, Araújo se manifestou contra a execução logo após a votação do STJ, pois argumentou que a Corte não possui essa prerrogativa.
O ministro Benedito Gonçalves acompanhou Araújo e também votou contra a homologação da pena de Robinho no Brasil.
A BBC News Brasil procurou a defesa do ex-jogador para comentar o caso, mas não recebeu resposta até a publicação desta reportagem.
Em um vídeo publicado nas suas redes sociais no domingo (17), Robinho afirmou ser inocente e ter sido condenado injustamente.
“Estou comprometido em provar minha inocência e lutar pela justiça verdadeira”, disse o ex-jogador.