No extremo leste do Chade, mulheres com roupas coloridas tentam cozinhar numa fogueira improvisada, em frente às tendas dos refugiados. Fazem parte das famílias da região de Darfur, no oeste do Sudão, que conseguiram fugir para o outro lado da fronteira, em direção ao Chade. Estão vivas, mas ficaram sem nada:
“Eu e o meu marido temos quatro filhos. A vida é muito difícil. Aqui recebemos um saco de 10 quilos de comida todos os meses, mas isso não chega. A comida simplesmente não é suficiente”, contou à DW uma testemunha que não quer ser identificada.
As organizações internacionais de ajuda humanitária não têm fundos para fazer face à catástrofe humanitária. Só no Chade vivem pelo menos 800.000 refugiados do Sudão, diz Pierre Honnorat, do Programa Alimentar Mundial.
“Precisamos urgentemente de financiamento para esta crise. É urgente porque primeiro temos de comprar os alimentos e trazê-los para o Chade e depois transportá-los até aqui, para a fronteira, para que as pessoas aqui recebam pelo menos uma refeição por dia.”
Sete milhões de refugiados
No Sudão, os dois homens mais poderosos do país estão em conflito desde abril passado. De um lado está Abdelfaftah al-Burhan, o chefe do Exército e presidente do Conselho Soberano do Sudão, do outro, o seu antigo adjunto, Mohamed Hamdan Dagalo, que comanda as chamadas Forças de Apoio Rápido.
Os combates alastraram-se a todo o país, afetando até zonas residenciais. A situação no Sudão não podia ser pior, disse recentemente Jan Egeland, diretor do Conselho Norueguês para os Refugiados, numa entrevista à emissora alemã ARD.
“Entristece-me que o mundo esteja a ignorar um dos maiores desastres humanitários da nossa geração. Sim, há a guerra na Ucrânia, a crise em Gaza. Mas como é que o mundo pode esquecer, em apenas alguns meses, que mais seis milhões de pessoas tiveram de fugir daqui? As mulheres estão a ser violadas, os hospitais estão a ser bombardeados, os campos de refugiados estão a ser bombardeados!”
Segundo os relatos, a situação é particularmente difícil na região de Darfur, no extremo oeste do Sudão. As milícias das Forças de Apoio Rápido voltam a ser acusadas de crimes brutais contra os direitos humanos. Vinte anos depois, a crise vivida no Darfur em 2003 parece estar a repetir-se, lembra Jan Egeland.
“O Darfur está atualmente a sofrer uma limpeza étnica maciça”, começou por explicar o diretor do Conselho Norueguês para os Refugiados, que trabalha nas Nações Unidas há 20 anos.
“O Darfur era uma questão importante, o então Presidente dos Estados Unidos, George W. Bush e o primeiro-ministro britânico Tony Blair estavam determinados a ajudar a população. Hoje, está a acontecer novamente o mesmo em Darfur – centenas de milhares de pessoas estão a ser deslocadas, milhares já foram massacradas – e ninguém parece ter consciência disso.”
Comunidade internacional ignora Sudão?
A crise parece não ter fim à vista: até agora, todos os esforços de mediação internacional para um cessar-fogo falharam. Diz-se mesmo que algumas potências estarão a alimentar o conflito no Sudão, que é rico em matérias-primas – as milícias controlam várias minas de ouro no país.
As relações entre o Governo sudanês e as Nações Unidas são cada vez mais tensas. O enviado especial alemão Volker Perthes foi declarado “persona non grata” e demitiu-se. E o Sudão apelou à ONU para encerrar a missão de estabilização no país.
“Uma civilização inteira foi destruída, 24 milhões de pessoas precisam de ajuda. Se o que está a acontecer no Sudão estivesse a acontecer noutro lugar e não em África, estaria no topo da agenda política. É a guerra mais esquecida do nosso tempo.”
Por Anna Osius