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Sexta-feira, Novembro 22, 2024

Dossier Ação Climática Parte I – Da Cimeira da Terra de 1992 no Rio de Janeiro à COP28 de 30 de novembro no Dubai

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A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, mas conhecida pela Cimeira da Terra de 1992, foi um evento internacional organizado pela Organização das Nações Unidas (ONU), na cidade do Rio de Janeiro, entre os dias 3 e 14 de junho de 1992. Esta foi a segunda grande conferência internacional sobre as questões ambientais, tendo sido um prolongamento importante da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em junho de 1972, em Estocolmo (Suécia).

A Cimeira da Terra de 1992 foi concebida com o intuito de debater formas de reconciliar o desenvolvimento económico e a utilização de recursos com a preservação ambiental, objetivo traduzido por meio do conceito de desenvolvimento sustentável. A Conferência identificou três riscos fundamentais que afetam o desenvolvimento sustentável: mudanças climáticas, perda de biodiversidade e desertificação.

Com base nestes três riscos, foram criadas três convenções, cada uma focada em abordar e erradicar cada um destes impactos ambientais, embora a mais conhecida seja a convenção sobre mudanças climáticas. O debate atual é dominado pelas mudanças climáticas, tanto pela dimensão do problema que representam, acabando por ter impacto nos outros dois riscos – perda de biodiversidade e desertificação -, como pela necessidade de acelerar a ação dos governos, do sector privado e sociedade em geral para enfrentá-lo.

Desde então, as discussões no âmbito das Nações Unidas sobre os três temas têm sido realizadas pela COP (Conference of the Parties, em inglês) ou Conferência das Partes traduzida para o português, sendo a COP sobre mudanças climáticas a que mais atrai a atenção devido à sua urgência e às implicações do risco causado pelas alterações climáticas.

A mudança climática representa uma ameaça global cada vez mais urgente para as vidas e meios de subsistência de milhões de pessoas. Esse desafio é particularmente importante para a África subsaariana, que tem uma população altamente vulnerável e onde os choques climáticos muitas vezes agravam as tensões sociais existentes e as preocupações com a segurança alimentar.

Apesar de ser a região que menos contribui para as emissões de gases de efeito estufa, a África subsaariana é a mais vulnerável a choques relacionados com o clima. Dos 10 países mais vulneráveis do mundo, o Banco Africano de Desenvolvimento estima que 8 estão localizados na África Subsaariana.

A Conferência das Partes sobre mudanças climáticas é realizada anualmente. O número em frente da sigla representa a edição da COP, ou seja, a COP28 sobre mudanças climáticas, que se realiza de 30 de novembro a 12 de dezembro 2023 no Dubai, Emirados Árabes Unidos, é a vigésima oitava COP sobre o tema.

A seguir a Cimeira do Rio de Janeiro de 1992, a primeira COP1 foi realizada em 1995 em Berlim, e desde então, as COPs sobre as mudanças climáticas têm sido realizadas anualmente na Europa, Africa, Asia e América. A COP1 em Berlim, limitou-se a validar as conclusões da Cimeira do Rio, embora as reuniões anuais em Berlim que se organizam desde então sobre as mudanças climáticas façam atualmente parte do roteiro de preparação das futuras COPs.

O Regime Climático atual, definido na Cimeira da Terra de 1992 no Rio de Janeiro, Brasil, institucionalizou uma arquitetura baseada no princípio de um problema global, mas com responsabilidades e capacidades diferenciadas. Esse princípio reconheceu as diferentes capacidades dos países e ajustou as suas responsabilidades no combate às mudanças climáticas. O regime do Rio de Janeiro também reconheceu o crescimento económico sustentado e a erradicação da pobreza como prioridades nacionais legítimas. Esses dois princípios constituem a base de referência dos países em desenvolvimento, particularmente africanos, no quadro das negociações sobre a ação climática.

A Cimeira do Rio de Janeiro reconheceu que as emissões dos países em desenvolvimento precisariam crescer para atender às suas necessidades de desenvolvimento atuais e futuras. O esquema isentava os países em desenvolvimento de qualquer ação de mitigação não compensada, devido às suas baixas emissões per capita. Isso significaria que os países ricos teriam de compensar os países em desenvolvimento para que estes adotassem medidas de mitigação climática.

O marco mais importante depois da Cimeira do Rio, foi a COP3 em 1997, em Quioto, Japão. O Protocolo de Quioto incorporou compromissos de mitigação juridicamente vinculativos com metas e cronogramas para os países desenvolvidos, mas não para os países em desenvolvimento.

A COP15 em 2009, em Copenhague, Dinamarca, definiu o objetivo de manter o aquecimento global abaixo de 2°C, enquanto os países desenvolvidos se comprometeram a ajudar financeiramente os países em desenvolvimento a fazer frente às mudanças climáticas.

O Fundo Verde para o clima, estabelecido para ajudar os países em desenvolvimento foi criado em 2010 durante a COP16 em Cancun, México.

A grande mudança na arquitetura do Regime Climático herdado da Cimeira do Rio de Janeiro deu-se com o Acordo de Paris, COP 21 em 2015. Os países adotaram por unanimidade o objetivo de manter o aquecimento global abaixo de 2°C e continuar os esforços para limitá-lo a 1,5°C.

As Contribuições Nacionalmente Determinadas – CND (NDC – Nationally Determined Contributions) estão no cerne do Acordo de Paris e na concretização dos seus objetivos a longo prazo. As CND incorporam os esforços de cada país para reduzir as emissões nacionais e adaptar-se aos impactos das alterações climáticas. O Acordo de Paris (artigo 4.º, n.º 2) exige que cada Parte prepare, reporte e mantenha sucessivas Contribuições Nacionalmente Determinadas (CND) que pretende alcançar. As Partes adotarão medidas nacionais de mitigação com o objetivo de alcançar os objetivos de tais contribuições.

Os países ricos tornaram-se muito menos “generosos” para com os países em desenvolvimento na sua abordagem da ação climática. Essa mudança deve-se principalmente a dois fatores.

O primeiro, e talvez o mais importante, as Cimeiras do Rio de Janeiro e de Quioto foram realizadas numa época em que a ação climática não era de facto uma prioridade da agenda internacional. Era um assunto para especialistas e cientistas “visionários”. Na altura não se falava em energias renováveis e poucos acreditavam no futuro dos carros elétricos. Só muito mais tarde é que a comunidade internacional se deu conta da amplitude do choque climático e da urgência em intervir para evitar uma catástrofe à escala mundial. Os países desenvolvidos deram-se conta tardiamente dos custos gigantescos das medidas de mitigação climáctica para reverter, ou pelo menos abrandar, as mudanças climáticas.

O segundo fator está ligado a “fadiga” dos países desenvolvidos em relação a ajuda ao desenvolvimento. Nos anos 90s, quando se realizaram as duas cimeiras do Rio de Janeiro e Quioto, os países ricos reunidos no quadro da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) ainda acreditavam que pudessem atingir 0.7% do seu Produto Nacional Bruto em Ajuda Oficial ao Desenvolvimento.

O início do século 21 foi marcado por um grande otimismo em relação aos países em desenvolvimento, com iniciativas como os “Objetivos de Desenvolvimento do Milénio” e o cancelamento da dívida dos países pobres.

Quando se realizou a Conferência de Paris em 2015 sobre a ação climática, já a ajuda ao desenvolvimento tinha começado a diminuir.

O Acordo de Paris de 2015 não se referiu explicitamente a agrupamentos de países, apenas alavancou as respectivas capacidades como uma forma subtil de diferenciação entre países em diferentes estágios de desenvolvimento.

Sob o Acordo de Paris, todas as partes são obrigadas a fazer promessas nacionais voluntárias em relação às suas metas de mitigação climática de longo prazo e rever o seu progresso ao longo do tempo. Com os olhos postos na China e outros países emergentes, o acordo incentivou os países em desenvolvimento a aumentar as suas ambições em relação as metas de mitigação climática à luz das suas capacidades. O acordo deu apenas aos Países Menos Desenvolvidos (Angola é considerada um PMD) e aos Pequenos Estados Insulares em desenvolvimento flexibilidades únicas na preparação de ações de mitigação e as priorizou para o financiamento climático.

A COP 26 em 2021 em Glasgow marcou outra etapa importante no processo da ação climática, sendo os dois principais resultados da COP26 a assinatura do Pacto Climático de Glasgow e a aprovação do Livro de Regras de Paris. O principal objetivo era garantir a neutralidade carbónica global até meados do século e manter ao alcance um máximo de 1,5° C de aquecimento. O conceito de Net zero foi introduzido no vocabulário sobre as mudanças climáticas. Net zero significa que as emissões totais são iguais ou inferiores às emissões removidas do meio ambiente. Pela primeira vez, é mencionada a eliminação acelerada de uma das principais fontes de CO2, o carvão, e reforçado o investimento nas energias renováveis.

Em relação a ajuda aos países em desenvolvimento, o Pacto Climático de Glasgow estabelece a necessidade de mobilizar o financiamento climático de todas as fontes para atingir o nível necessário para alcançar os objetivos do Acordo de Paris, incluindo um apoio significativamente reforçado aos países em desenvolvimento, acima de 100 mil milhões de dólares por ano.

Em 2022, a COP 27, em Sharm El-Sheikh, no Egito, teve resultados mitigados. Por um lado, foi tomada a decisão de criar um fundo para perdas e danos para ajudar os países em desenvolvimento a enfrentar catástrofes naturais causadas pelas alterações climáticas. Foi também lançada uma iniciativa para garantir a sustentabilidade da Agricultura e da Segurança Alimentar. Mas, por outro lado, a COP27 não conseguiu chegar a um acordo sobre os combustíveis fósseis, no prolongamento da decisão da COP26 de acelerar a eliminação progressiva do carvão. Vários países, especialmente os da União Europeia, tinham defendido veementemente a eliminação progressiva dos combustíveis fósseis.

A Importância da COP28

As preocupações de equidade da ação climática estão enraizadas na assimetria entre emissões e compartilhamento de carga, por exemplo, quando se trata do risco de exposição a impactos ou dos custos de mitigação e adaptação de emissões. Por um lado, a maioria das emissões de gases de efeito estufa causadas pelo homem armazenadas na atmosfera têm origem em atividades realizadas em países ricos ou emergentes – mas os processos naturais colocam uma carga surpreendentemente maior de impactos nas nações mais pobres.

Os países industrializados são responsáveis por três quartos das emissões globais cumulativas lançadas na atmosfera da Terra desde o início da Revolução Industrial. Esses países ainda têm emissões per capita muito mais altas hoje.

No entanto, grandes países emergentes, como a China, India e Brasil tornaram-se grandes emissores de gases de efeito estufa à medida que as suas economias cresceram, aumentando a pressão internacional para que tomem medidas para lidar com as suas emissões. A ascensão de potências emergentes, que introduzem uma maior diversidade de interesses nos principais conselhos de governança, complicou a questão da equidade na ação climática.

Os países emergentes defendem a posição que questões de responsabilidade internacional e prestação de contas sobre o tema já foram debatidas, negociadas e decididas no Rio de Janeiro quando o regime climático foi formado e aceite por unanimidade. Eles dizem que as suas emissões agregadas e per capita precisam de aumentar porque, apesar dos recentes sucessos de desenvolvimento, eles continuam longe de garantir padrões de vida razoáveis para as populações.

Mas, na altura em que se negociou o regime climático no Rio de Janeiro, nenhum desses países fazia parte das principais economias mundiais. Hoje a China, India e o Brasil estão entre as 10 maiores economias do mundo.

Para os países industrializados, o progresso do desenvolvimento e as novas posições de poder político das economias emergentes transformaram as noções de justiça e legitimidade na política climática e tornaram ultrapassada a visão de um mundo binário baseado em países em desenvolvimento versus países desenvolvidos.

Como resultado do poder de negociação entre as duas partes – países ricos e países emergentes – os países em desenvolvimento, particularmente os países africanos, encontram-se espremidos num complexo sistema de alianças.

Os desafios para a COP28 são enormes. É a primeira vez desde a COP 21 que vai se realizar um balanço global dos acordos de Paris em relação às Contribuições Nacionalmente Determinadas (CND) de cada país, os resultados atingidos por país e as novas metas. A questão do financiamento e a ajuda aos países em desenvolvimento estarão também no centro das decisões.

Outro tema que terá um enorme impacto está relacionado com os combustíveis fósseis e a decisão se podem fazer parte da matriz energética do futuro ou, pelo contrário, devem ser gradualmente eliminados. Qual será o impacto desta medida nos países em desenvolvimento produtores de petróleo, como Angola e Nigéria?

Esses temas serão desenvolvidos nos próximos dois artigos.

José Correia Nunes
Director executivo Portal de Angola

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