Conselho Europeu anunciou apoio de 20 milhões de euros ao Ruanda para ajudar a combater o terrorismo em Cabo Delgado. À DW analista defende que apoio devia ser dado à vítima, Moçambique.
O Governo de Moçambique e a União Europeia (UE) reafirmaram recentemente o compromisso “de uma parceria profunda”, com destaque para “o reforço do diálogo político, tendo em conta a posição de Moçambique como membro não permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas”.
Um reforço de parceria que acontece numa altura em que o Conselho Europeu anunciou um apoio de 20 milhões de euros às Forças de Defesa do Ruanda para ajudar a combater o terrorismo na província moçambicana de Cabo Delgado, que combatem a insurgência armada na província ao lado das tropas moçambicanas.
O chefe de estado do Ruanda, Paul Kagame anunciou na última quarta-feira o envio de mais tropas para combater a insurgência armada em Cabo Delgado e justificou o financiamento com o fato de até então, “nem um único país ou organização” ter apoiado a operação do Ruanda na província moçambicana.
Em entrevista à DW, o analista e especialista em Relações Internacionais, Rufino Sitoe, questiona porque é que os 20 milhões não foram alocados diretamente ao Estado moçambicano que está a ser vítima da violência.
DW África: Porquê 20 milhões para o Ruanda e não para Moçambique?
Rufino Sitoe (RS): Obviamente que o Ruanda também não vai estar a alocar as forças a custo zero, mas começamos a nos perguntar porque que estes recursos não estão a ser alocados diretamente para o Estado que está a ser vítima do conflito, sobretudo num contexto em que o nosso Chefe de Estado já apareceu publicamente a dizer que solicitava apoio e material para o conflito.
Há uma carência sob ponto de vista da capacidade diagnosticada das nossas Forças de Defesa e Segurança, e que esta carência ainda não foi suprida, mas que já está a ser drenado apoio a um outro parceiro que não está a ser afetado pelo conflito e que está simplesmente a prestar um papel de apoio. Então começamos a entrar, mais ou menos, neste jogo de suspeição e começamos inclusive a questionar as intenções da União Europeia, a prestar este tipo de apoio.
DW África: O que este financiamento dirigido diretamente ao Ruanda pode significar para a manutenção de todas as forças no terreno?
RS: Primeiro, fica aquele sentimento de que há uns que estão a ser mais beneficiados do que os outros, que há quem está a ser privilegiado neste conflito. E depois, fica também esse sentimento de alienação, porque nós estamos a lutar por isso e fica parecer que alguém está a tirar benefícios, e na verdade alguém já está a tirar um benefício claro, não é apenas aparência.
Então, do ponto de vista de motivação das forças no terreno, mesmo para as forças nacionais, fica a impressão de que há forças muito privilegiadas e há forças totalmente desconsideradas.
DW África: Acha que este financiamento diretamente para as forças de defesa do Ruanda pode beliscar as relações de Moçambique com a União Europeia?
RS: Há algum nível de suspeita nestas relações, sobretudo levantando o ponto que disse anteriormente, sobre o Estado moçambicano ter pedido apoio direto à União Europeia para ajudar com outros meios de combate. Portanto, ficam as questões, porquê que está a ser mais relevante apoiar este parceiro, que negociação direta vocês têm com este parceiro, que se calhar o Estado moçambicano esteja alheio a este processo negocial, mas sob questões que dizem respeito ao Estado moçambicano.
DW África: Isto acontece também, semanas antes de Moçambique assumir o seu lugar rotativo no Conselho de Segurança das Nações Unidas, portanto é a voz de África no que concerne a segurança…
RS: Eu penso que, ter esta presença no Conselho de Segurança da ONU, é um bom exercício para a própria autoridade moçambicana. Era até mais conveniente drenar apoio a este país que tem um assento no Conselho de Segurança das Nações Unidas.
DW
Por Neusa e Silva