Notícia da conclusão do processo dos generais trouxe a debate alegada seletividade na “cruzada contra a corrupção” em Angola. Questiona-se porque razão o ex-vice-presidente e outras figuras não são constituídos arguidos.
Na última terça-feira (12.07), a Procuradoria-Geral da República (PGR) de Angola anunciou que o processo que envolve os generais Hélder Vieira Dias Júnior “Kopelipa” e Leopoldino do Nascimento “Dino” está concluído.
Kopelipa e Dino, como são conhecidos em Angola, são acusados pelo Ministério Público de associação criminosa, peculato, branqueamento de capitais entre outros.
Em entrevista à DW África, o jornalista e analista Ilídio Manuel entende que “há um passo nesse sentido”. Porém, desconfia que o anúncio seja “eleitoralista”.
“Este processo já se arrasta há muito tempo e o facto de se registar na véspera das eleições fica-se com a ideia que prossegue um fim eleitoralista no sentido de passar a ideia de que o combate à corrupção continua”, argumenta.
Para João Malavindele, da ONG Omunga, com sede em Benguela, a luta contra a corrupção é “irreversível”, mas é “imperioso” rever os métodos da atuação.
“Sobretudo agora com a morte do ex-Presidente, a coisa fica mais complicada porque os maiores casos de corrupção aconteceram no seu Governo. E as pessoas, nessa altura em causa, foram de alta confiança do seu reinado. Daí o meu ceticismo relativamente ao desfecho deste processo”, diz.
Selectividade no combate à corrupção?
A notícia trouxe a debate o tema da alegada seletividade na “cruzada contra a corrupção.” Ilídio Manuel questiona, por exemplo, por que motivo o processo contra o ex-vice-presidente de José Eduardo dos Santos, Manuel Vicente, não avança.
Em Maio de 2018, a justiça portuguesa enviou o seu processo a Angola, a pedido de Luanda. Em Lisboa, Vicente estava a ser acusado de corromper um magistrado do Ministério Público, Orlando Figueira.
“Também não se sabe porque razão Manuel Vicente não foi arrolado neste processo que foi praticamente uma das peças fundamentais nessa questão da corrupção que envolveu dinheiro do Estado”, lembra o analista.
Figuras “praticamente intocáveis”
Ilídio Manuel acrescenta que a pronúncia destas duas figuras não significa necessariamente que o combate à corrupção em Angola deixou de ser seletivo: “Há determinadas figuras, como Edeltrudes Costa, que é diretor do Gabinete do Presidente da República, e o ministro da Energia e Águas, que são praticamente intocáveis.”
Em 2020, a televisão portuguesa TVI denunciou que Edeltrudes Costa havia construído uma fortuna que não é compatível com as suas funções no Governo. No ano seguinte, o procurador-geral da República, Helder Pitta Grós, disse que se estava “apurar dados para investigar”. De lá para cá, apenas silêncio.
João Malavindele também diz que o combate à corrupção “tem transparecido seletivo”. E “curiosamente sabemos que há indícios de que estas pessoas possivelmente estejam envolvidas em atos de corrupção, mas até agora não há processo e não há nada”, lembra.
Por isso, o responsável da Omunga sublinha: “É urgente e é necessário fazermos uma paragem relativamente a essa questão e analisarmos o que já se fez até agora e como é nós podemos caminhar.”