■ Ouvi com alguma expectativa, por causa de todo o estardalhaço que foi feito à sua volta, a “entrevista estranha”* que a TPA organizou esta sexta-feira onde durante mais de duas horas se falou de um grupo que quer desestabilizar o país, inviabilizando a sua governação na sequência da onda de violência urbana que segunda-feira, assolou particularmente a zona do Benfica, aqui em Luanda.
Embora a entrevista tivesse sido gravada de véspera, tendo em conta o elevado nível da troika presente, estava de facto à espera de algumas revelações que dessem um pouco mais de sentido à “teoria da conspiração” avançada por JLo dois dias depois do inédito ataque por um grupo de populares a um Comité Distrital do MPLA que resultou na sua destruição total.
Não se percebeu bem o dramático alerta feito pelo PR, uma vez que na mesma mensagem JLo destacou que a condenação dos incidentes de segunda-feira foi feita em uníssono por todos os partidos políticos e demais forças vivas do país.
Talvez tenha sido a forma que JLo encontrou para justificar melhor aquela sua mensagem ao país, porque de outro modo não houve no episódio do Benfica mais pano para mangas.
Em conclusão, falou-se muito do tal grupo, mas em substância pouco se disse sobre o mesmo, tendo apenas ficado no ar a promessa da investigação em curso vir a produzir proximamente os necessários esclarecimentos que venham a justificar a “teoria da conspiração” já referida.
Enquanto tal não acontece e, diante dos factos em presença, para já não consigo divisar muito mais do que apenas aquela explosão de violência mais ou menos espontânea que até se pode voltar a repetir com outras características.
É bom não esquecer que em Luanda já foram atacadas e destruídas instalações da própria polícia na sequência de desentendimentos com as comunidades.
Isto para dizer que a rigor nem sequer estamos bem diante de uma novidade, numa cidade onde os níveis de violência para todos os gostos e feitios e com as mais diferentes motivações não têm parado de aumentar.
O anterior temor reverencial que existia em relação às autoridades já pertence ao passado.
Mas mais importante do que tudo isto, é que de facto, não consigo ver alguma força política deste país apostada na subversão da ordem constitucional, instrumentalizando jovens mais temerários/exaltados para levarem a cabo acções violentas com impacto mediático visando criar um clima pré-insurreccional.
Dito isto, como é evidente, não podíamos ter começado o ano da pior forma.
■ *O “género” que foi praticado na TPA é uma “entrevista estranha”, portanto atípica, em que no fundo entrevistado é um só, mas aparece a falar com três caras diferentes, a ter em conta a continuidade das suas respostas que convergem exactamente para o mesmo objectivo previamente definido em combina com o entrevistador.
É diferente do modelo conhecido por “grande jury” onde no mínimo três jornalistas questionam um convidado.
Na verdade a tal “entrevista colectiva” de que muito se falou, tem mais a ver com o “grande jury” se efectivamente os jornalistas estivessem em condições de perguntar ao entrevistado o que bem entendessem, não lhe permitindo nunca que transformasse a entrevista numa palestra, como aconteceu no recente encontro do PR com cinco jornalistas escolhidos a dedo pela sua assessoria.
Nesta “entrevista estranha”, o entrevistado (3 em 1) ainda teve direito a fazer um discurso inicial escrito.
Reginaldo Silva*
* Jornalista | In Facebook