O desaparecimento do jornalista do Ruanda, Ntamuhanga Cassien, asilado em Moçambique, no passado dia 23 levanta o debate em torno do braço do regime de Kigali no país, tal como tem denunciado activistas em vários países.
O Centro para a Democracia e Desenvolvimento (CDD) diz que o Governo do Ruanda pode estar estar envolvido no desaparecimento de Cassien, um crítico do regime de Paul Kagame, que era procurado pelas autoridades de Kigali.
Cassien vivia na Ilha da Inhaca, pertencente à cidade de Maputo, onde desenvolvia actividades comerciais e foi sequestrado por oito indivíduos, incluíndo um elemento que falava o idioma do Ruanda, desconhecendo-se ainda o seu paradeiro.
O CDD diz que o facto de que Cassien era procurado pelas autoridades ruandesas reforça a ideia do envolvimento do regime de Kagame no desaparecimento daquele jornalista, de 37 anos, e realça que alguns jornalistas ligados ao regime de Kigali, anunciaram nas redes sociais, no passado dia 24, que o Governo ruandês aguardava a extradição de Cassien.
Considera o CDD que a reaproximação entre os Presidentes ruandês e moçambicano aumenta receios de que Maputo seja mais aberto a extradições extrajudiciais de cidadãos do Ruanda refugiados em Moçambique, em troca de um provável apoio de Kigali no combate ao terrorismo em Cabo Delgado.
Algumas vozes entendem que com esta reaproximação, Kigali pode, eventualmente, pretender fazer em Moçambique o mesmo que fez na África do Sul, perseguir os seus opositores.
O analista Raúl Domingos diz não saber se isso corresponde à verdade, mas “existe alguma razão”.
“Repare que o Ruanda participou, em Maputo, na cerimónia de assinatura do Acordo de Paz Definitiva, em 2019, mas não foi protagonista do processo negocial em Moçambique, então, como é que aparece nesta cerimónia?”, interroga-se aquele analista.
Por seu turno, o jornalista Fernando Lima considera que pode não haver uma relação directa entre o eventual envolvimento do Ruanda no conflito em Cabo Delgado e a questão da alegada perseguição a cidadãos ruandeses, embora haja críticas por violação de direitos humanos naquele país.
Lima realça que essa questão dos direitos humanos tem que ser considerada, “e Paul Kagame, apesar de ser muito aclamado por uma série de coisas que aconteceram no Ruanda, também é muito criticado por ter mão dura nas questões dos direitos humanos”.
Entretanto, em conversa com a VOA, o porta-voz da Associação dos Ruandeses Refugiados em Moçambique, Cleophas Habiyaremye reiterou que o jornalista foi levado à esquadra de Inhaca, onde o comandante afirmou que o caso era complicado e devia ser encaminhado para Maputo.
Por seu lado, o porta-voz do Serviço Nacional de Investigação Criminal (Sernic) em Maputo, Hilário Lole, garantiu à VOA que “ninguém nos contactou, nem familiar nem a comunidade” e que soube do alegado rapto pelo comunicado posto a circular pela Associação dos Ruandeses Refugiados em Moçambique.
O jornalista Cassien fugiu da prisão de Kigali, em 2017, onde cumpria uma pena de 25 anos, após ter sido condenado por crimes de conspiração contra o Governo e cumplicidade em acto terrorista, num processo, segundo o CDD, com motivações políticas.