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Segunda-feira, Novembro 25, 2024

Covid-19: A pandemia tornou os PALOP menos democráticos?

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FONTE:DW

Há um ano, a pandemia da Covid-19 obriga os cidadãos a novas formas de estar e, acima de tudo, a renunciar a liberdade para evitar perdas humanas. Terá a pandemia levado a que os países se tornassem menos democráticos?

“Cabo Verde, como já é do conhecimento, registou na ilha da Boavista o primeiro caso de Covid-19”, anunciava assim, a 19 de março de 2020, o ministro da Saúde de Cabo Verde, Arlindo do Rosário.

O arquipélago foi o primeiro país entre os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) a registar, há um ano, os primeiros casos da doença que veio mudar as das pessoas em todo o mundo. Pouco depois, foi a vez de Angola (a 21 de março), Moçambique (22 de março), Guiné-Bissau (25 de março) e, mais tarde, São Tomé e Príncipe (6 de abril).

Com os primeiros casos de infeção, os Estados viram-se obrigados a impor medidas restritivas – como o isolamento domiciliar e a utilização das máscaras – numa tentativa de salvar vidas. Novas regras, num “novo normal”, que em alguns países trouxe descontentamento, detenções arbitrárias e protestos tendo muitos deles resultado em mortes.

Até maio do ano passado, dois meses depois do início do estado de emergência em Angola, as forças de ordem e segurança mataram cinco pessoas, mais do que a própria Covid-19.

“Situação que está a acontecer aqui no país, os polícias estão a matar muito. É a vida de alguém, não pode”, relatava à reportagem da DW África em Angola um cidadão.

À exceção da Guiné Equatorial, Angola é atualmente o país africano de língua portuguesa pior cotado em matéria de direitos políticos e liberdades civis, de acordo com o relatório anual da Freedom House. Segundo os indicadores da ONG, é um país ‘não livre’ com uma classificação de apenas 31 pontos num total de 100.

 - portal de angola
Human Rights Watch alerta para o uso excessivo de força da polícia em Angola<br >DR

Período atípico democraticamente
Luís Jimbo, diretor do Instituto Angolano de Sistemas Eleitorais e Democracia (IASED), considera que a pandemia contribuiu “significativamente para os baixos índices e o estagnar da democracia”.

“No antes Covid-19 em Angola houve muita expetativa de abertura democrática, mas o período Covid-19 veio trazer um impacto nas restrições dessas expetativas. Estamos de facto num período atípico democraticamente em que é difícil fazer um balanço se foi bom ou foi mau, mas no seu todo a Covid-19 teve impacto de restrição no exercício dos direitos fundamentais e da democracia, claro”, explica.

Para Jimbo, “o que se viveu neste período da pandemia [em Angola] foi um reflexo da expetativa que se ganhou de liberdade com a nova era de João Lourenço”.

“Criou grande expetativa e grande liberdade e depois houve um confinamento, houve restrições e as pessoas não cederam. Não cederam às liberdades que ganharam e estamos a assistir a essa adaptação não só dos cidadãos, mas das autoridades públicas em respeitar aqueles direitos que já foram ganhos”, acrescenta.

 - portal de angola
Para Nhamire democracia está num dos seus piores momentos<br >DR

Democracia em declínio em Moçambique
Moçambique não ficou atrás no que toca, por exemplo, às detenções arbitrárias e medidas como o recolher obrigatório não foram consensuais.

Para Borges Nhamire, analista do Centro de Integridade Pública (CIP), “Moçambique vive um dos piores momentos em termos de democracia”, contudo não culpa a pandemia.

“A sociedade civil continua a trabalhar livremente mesmo em contexto de Covid-19, os partidos políticos continuam a realizar conferências de imprensa ou atividades juntando mais de 20 pessoas. Então não foi necessariamente a Covid-19 que trouxe as restrições às liberdades, aos direitos fundamentais que estamos a ver em Moçambique. São problemas das imperfeições da nossa democracia, mas a pandemia não foi necessariamente um grande problema dentro do contexto da nossa ‘quase democracia’”, expõe.

Comparativamente a outros países da região, Nhamire considera que os efeitos da pandemia na democracia em Moçambique “não foram graves”.

“Tivemos alguns problemas por exemplo a adoção do estado de emergência que era questionado pelos juristas no sentido de que podia estar a violar os termos da limitação das liberdades fundamentais previstas na Constituição da República, mas não foi tão gravoso.”

“Ou quando o Governo decidiu pelo recolher obrigatório, uma situação que não era vista em Moçambique talvez desde o fim da Guerra Civil. Houve alguns problemas no início, pessoas a serem detidas, levadas a pernoitar nas esquadras, em condições muito duvidosas e de violação dos direitos humanos e fundamentais dessas pessoas, mas a situação foi rapidamente resolvida”, acrescenta.

Democracia da Guiné-Bissau também ressentiu
Na Guiné-Bissau, a suspensão das aulas e o encerramento das escolas figuram entre as medidas ultimamente mais contestadas pela sociedade civil, no âmbito da pandemia.

Fodé Sanhá, presidente do Movimento da Sociedade Civil para Paz, Democracia e Desenvolvimento, não tem dúvidas: a pandemia teve impacto na democracia do país.

“De facto houve medidas que foram tomadas e que tinham que ver com salvaguardar vidas humanas tendo afetado bastante a liberdade de mobilidade e outras liberdades. Em todo o sentido, não só no aspeto democrático, mas também no aspeto económico, social e cultural, a pandemia tem penalizado”, assegura.

Cabo Verde, apesar da pandemia, não viu a democracia ser beliscada e continua a ser um exemplo nesse campo. Entre os PALOP, é – a larga distância – o que ocupa a melhor posição no ranking da Freedom House com 92 pontos em 100, sendo considerado um país livre. O arquipélago é seguido de São Tomé e Príncipe com 84 pontos.

No geral, a ano de 2020 foi 15º consecutivo de recuo dos direitos políticos e liberdades dos cidadãos a nível mundial, afetados pelas restrições impostas no contexto de combate à pandemia de Covid-19, segundo o último relatório “Liberdade no Mundo” da ONG Freedom House.

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