A produção de petróleo da OPEP+, organização que junta os Países Exportadores (OPEP) e um grupo de outros 10 produtores liderados pela Rússia, vai ser aumentada em 2 milhões de barris por dia (mbpd) já no primeiro dia de Agosto, se a agenda oficial da reunião desta semana do Comité Ministerial Conjunto de Monitorização (JMMC) do “cartel” for cumprida à risca.
O JMMC, o órgão que gere o dia-a-dia da OPEP e da OPEP+, vai reunir por videoconferência esta semana, entre quarta-feira e quinta-feira, para tomar uma das decisões mais importantes no contexto da actual crise gerada pela pandemia da Covid-19 que está a ser responsável por uma das mais severas crises económicas mundiais de sempre e, seguramente, aquela que mais danos causou no sector petrolífero no último século.
Em cima da mesa, de acordo com aquilo que é já um dado adquirido pelos media especializados e pelas agências de notícias que acompanham ao minuto o evoluir das praças petrolíferas, é que o acordo existente, firmado em Abril para vigorar entre Maio e Junho, e depois prolongado para finais de Julho, que retira 9,7 mbpd vai ser revisto e, a partir de 01 de Agosto, esses cortes vão ser reduzidos para 7,7 mbpd, provavelmente, até ao final do ano.
No entanto, com o aproximar da reunião que começa quarta-feira, os mercados estão a reagir com desconfiança a este desfecho esperado, com o Brent de Londres, que reflecte o sobe e desce do valor das ramas exportadas por Angola, uma queda que foi de cerca de 1% na segunda-feira e está hoje a perder de novo em semelhante valor. O WTI de Nova Iorque segue na mesma direcção no que concerne ao crude consumido e vendido nos EUA.
O que os mercados estão a reflectir, e que pode ser de extrema importância para a economia angolana, uma das mais fustigadas com a crise pandémica, tendo mesmo obrigado o Executivo de João Lourenço a rever o seu Orçamento Geral do Estado (OGE 2020) de 55 USD como valor de referência para o barril para 33, é que são poucas as certezas de que a recuperação do consumo justifica que se faça já esta correcção.
Para as contas angolanas o mais relevante neste correr dos mercados é que, tendo em conta que a matéria-prima ainda representa mais de 95% das exportações nacionais e mais de 35% das receitas, qualquer oscilação em baixa no valor do barril é mais um nó na corda que aperta a economia nacional.
Mas o que está, efectivamente, em cima da mesa, são apenas dúvidas, porque aquilo que foi, desde finais de Maio, a razão para a recuperação do consumo global, o aligeiramento das medidas de contenção da pandemia nas grandes economias planetárias e um aparente recuo na Covid-19, afinal, tratou-se de notícias relativamente apressadas, porque, tal como a Organização Mundial de Saúde (OMS) tem vindo a alertar, a realidade é totalmente diferente e a pandemia tem vindo a ganhar fôlego em vez de estar a retroceder.
Um dos exemplos mais claros sobre o risco que se enfrenta aqui chega da Califórnia, EUA, onde o governador local, em contra-mão com aquilo que defende o Presidente Donald Trump, face a um aumento substancial de novos casos, mais de 8 mil só na segunda-feira, mandou encerrar de novo bares e restaurantes, num claro sinal de que novas medidas de confinamento podem surgir a qualquer instante, reforçando as possibilidades de um aumento da desconfiança numa recuperação mais célere.
E se os números da Covid-19 não recuarem de forma sólida, se um medicamento não for descoberto, ou uma das centenas de vacinas a serem desenvolvidas em todo o mundo não aparecer até final do ano, como a OMS tem advertido ser muito difícil, o risco é que o aumento da produção no seio da OPEP+ possa ser um tiro no pé, ou mesmo na perna, tratando-se das economias mais dependentes da exportação de crude, como é o caso da angolana.
Em pano de fundo está este resumo: Antes da pandemia o mundo consumia quase 100 mbpd, em Abril estes valores, por causa dos confinamentos, tinham escorregado para 70 mbpd, sendo que os 30 mbpd perdidos no consumo, até ao momento a OPEP+ equilibrou em 9,7 mbpd nos cortes em vigor, as economias começaram a recuperar ligeiramente e os EUA observaram uma quebra na produção do seu sector alternativo, ou fracking.
E no valor do barril, essa diferença é ainda mais expressiva, porque entre o início de Janeiro e final de Abril, a quebra foi superior a 40 USD, passando de mais de 68 dólares para pouco mais de 20, estando, no entanto, a recuperar agora para a casa dos 40, como é o caso do Brent, que estava hoje, cerca das 11:20, apesar da perda de 0,59% em relação a segunda-feira, no fecho, a valer 42,47 USD, claramente acima, quase 10 USD, do valor de referência do OGE 2020 revisto de Angola.
Contas feitas, o mundo, apesar de uma recuperação evidente, ainda está longe dos valores de consumo de Novembro de 2019, quando o novo coronavírus ainda estava escondido na China, sendo que viria a ser descoberto, oficialmente, na cidade de Wuhan, em Dezembro, os grandes sorvedouros da produção global, o transporte aéreo de passageiros e a marinha mercante e turística – cruzeiros -, que, juntos, são responsáveis por quase 20% do petróleo consumido, ainda estão quase parados.
Este é o contexto que os membros do JMMC da OPEP+ vão ter em cima da mesa quando, na quarta-feira, iniciarem os trabalhos de análise para propor o aumento da produção, correndo, claramente, o risco de dar início a uma nova avalanche global nos mercados que estão desconfiados de tanto optimismo entre os membros do “cartel”.
Para Angola, este é um momento, ao que tudo indica, bom, porque tem sido um dos países da OPEP que mais resiste ao cumprimento da quota dos cortes assumidos a partir de 01 de Maio, podendo, assim, ver aligeirado a sua parte no esforço de redução da produção, mas se o tiro sair pela culatra, também será Angola um dos exportadores mais afectados negativamente com uma nova queda nos preços do barril.
Seja como for, há muito que se sabe que a OPEP faz aquilo que a Arábia Saudita quer que se faça e sabe-se também que na OPEP+, faz-se aquilo que a Arádia Saudita e a Rússia acordarem fazer, porque estes dois gigantes globais da produção e da exportação operam com volumes – à volta dos 11 a 12 mbpd – que, sem dúvida, ofuscam a produção dos restantes membros, podendo-se comparar com o maior produtor africano, a Nigéria, que pouco passa actualmente dos 2 mbpd, ou Angola, que está nos 1,3 mbpd.
E, aparentemente, o ministro saudita da Energia, Abdulaziz bin Salman Al-Saud e o seu homólogo russo, Alexander Novak, estão alinhados na estratégia a seguir neste momento porque, segundo se pode ler nas agências e sites especializados, ambos crêem que o consumo mundial está a recuperar e o crescendo nos números da pandemia da Covid-19 não vão atrapalhar essa recuperação.
Certo e seguro é que aquilo que Al-Saud e Novak pensam valerá de pouco ou nada se os números da pandemia acelerarem, como se pensa que vá acontecer, e os países, especialmente as grandes economias europeias, os EUA e a China voltarem a apertar nas medidas de confinamento.
E se assim for, as notícias sobre a “morte” da pandemia, e o optimismo a isso relacionado, poderão estar a ser ligeiramente exacerbadas pela ânsia que o mudo mostra de voltar a ser o que era antes da pandemia fazer os estragos que já fez e vai continuar a provocar.