Em Portugal, o desemprego aumentou devido à pandemia de Covid-19, mas são poucos os cidadãos dos PALOP a pedir apoio financeiro para o repatriamento, diz OIM. Processos de legalização estão atrasados.
Didier Vilela está há três anos em Portugal. Estava a estudar em Bragança, já no terceiro ano da Faculdade. Mas a doença da mãe obrigou o jovem oriundo de São Tomé e Príncipe a vir para Lisboa procurar trabalho na área da mecânica. O salário que ganhava ia quase todo para consultas e medicamentos. Entretanto, o surto do novo coronavírus alterou tudo.
“Estava a trabalhar a recibos verdes. Quando há trabalho é que me chamam. Depois, por causa da pandemia, já não havia trabalho e fui dispensado”, conta. E porque descontava todos os meses 20% do seu salário, o jovem são-tomense recorreu à ajuda da Segurança Social, mas até agora está à espera, sem nenhuma resposta.
Apesar das dificuldades por que passa, devido também à saúde da mãe, tem fé em voltar a trabalhar e continuar os estudos na área da Engenharia Eletrotécnica de Computadores. Para já, põe de parte recorrer à ajuda da Organização Internacional das Migrações (OIM) para regressar a São Tomé. “Tenho a minha mãe cá doente. Ela veio da Junta Médica. Por enquanto, está fora de questão essa possibilidade de regressar”, explica.
Legalização atrasada
Dilma Varela Moreira, natural de Cabo Verde a viver há dois anos em Portugal, teve mais sorte. Embora enfrente algumas dificuldades, mantém o emprego como empregada doméstica. Apenas lamenta os efeitos sociais do surto da pandemia, que afetaram o seu processo de legalização, através da Associação Apoio Imigrante.
“Sim, estava tudo orientado, só que dez dias antes telefonaram-me do SEF [Serviço de Estrangeiros e Fronteiras] a dizer que por causa da pandemia a minha marcação ia ser cancelada. E agora já estão a tentar remarcar. Estou aqui na Associação Solidariedade Imigrante para tirar os outros documentos que são precisos, que é para eu ir lá”, conta à DW.
Para já, a jovem cabo-verdiana também não tem motivos fortes que a levem a regressar ao país natal, porque quer retomar os estudos – é esse o seu sonho. “Está fora de questão. Graças a Deus tenho o meu trabalho. Acho que vou continuar, quem sabe regressar aos meus estudos para continuar com a minha vida”, suspira.
Desemprego cresce em Portugal
De acordo com a OIM, a pandemia de Covid-19 está a afetar a economia e a sociedade de forma transversal, incluindo as comunidades de imigrantes radicadas em Portugal, que também estão a ser atingidas pelo desemprego. No entanto, segundo Luís Carrasquinho da OIM, ainda são poucas as inscrições de elementos das comunidades africanas no Programa de Retorno Voluntário.
“Em 2020, até à data, inscreveram-se 383 migrantes no Programa de Retorno Voluntário. 78 regressaram aos países de origem. Em 2019, considerando o mesmo período de tempo, até maio, tínhamos 273 pessoas inscritas e 42 pessoas retornadas”, informa.
Das comunidades africanas, nomeadamente dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), já existem dois pedidos de retorno voluntário contra os 14 de 2019 – conta Luís Carrasquinho, ponto focal para o apoio ao retorno voluntário e à reintegração da OIM em Portugal.
Nos primeiros cinco meses do ano, o desemprego em Portugal subiu de 6 para 10%, afetando 392 mil pessoas, das quais 76 mil são fruto do coronavírus, o correspondente a cerca de 22%.
Portugueses em África
Por causa da pandemia, o desemprego poderá forçar muitos portugueses a procurarem alternativas de emprego noutras paragens, nomeadamente em África. A previsão é de Jorge Fonseca, fundador da consultora George Career Change, que aponta Angola e Moçambique como potenciais destinos para desempregados portugueses.
“Angola e [outros] países de África, tirando a África do Sul – tirando casos pontuais –, precisam de mão-de-obra qualificada e muitos portugueses poderão ter funções de destaque a apoiar economias em desenvolvimento”, analisa Jorge Fonseca.
“Em Angola e Moçambique, assim como em diversos outros países de África, deverá continuar a haver boas oportunidades para quadros séniores portugueses, dado que esses países apresentam grandes carências de quadros de gestão, mesmo com a forte queda do preço do petróleo nos últimos meses”, refere uma nota da consultora George Career Change.