A vida não está fácil para quem depende da circulação dos comboios dos Caminhos-de-Ferro de Luanda (CFL) quase todos os dias.
É o caso de Domingas Pascoal, 45 anos, que se dedica ao comércio de peixe. “Compro o peixe em Luanda e revendo na província de Malanje. Com a suspensão da circulação do comboio não sei como poderei sobreviver”, lamentou.
Há oito anos que Domingas Pascoal vende peixe em Malanje por ser mais lucrativo e disse que, além de fazer o uso do comboio, por ser o meio mais barato, também opta pela permuta.
Residente no Cazenga e mãe de três filhos, a comerciante diz ser a responsável pelos descendentes que os sustenta com base no rendimento da venda de peixe. “Com os lucros pago a escola e cubro outras necessidades básicas”.
Durante as primeiras horas do dia de ontem, a reportagem do Jornal de Angola constatou na Estação do Caminho-de-Ferro dos Musseques, no Rangel, a fraca movimentação de passageiros, pois boa parte dos viajantes já dominavam a informação, sobretudo os que habitualmente fazem uso deste meio.
A jovem Cristina Mota, com duas crianças ao colo, foi surpreendida com a paralisação dos comboios. Residente no bairro da Precol, tinha como destino a vila de Viana, mas não foi possível seguir viagem. Agora terei de apanhar táxi para chegar ao destino”.
Cristina Mota faz o trajecto Rangel/Viana com frequência, ou seja, duas ou mais vezes por semana. Explica que com a paralisação dos comboios a situação, para muitos, pode complicar-se, porque nenhum bolso suportará o táxi.
A passagem normal de comboio dentro de Luanda custa 30 kwanzas na classe normal, 200 na segunda e 500 para a primeira. Para Luanda a Malanje paga-se 3.000 kwanzas. Por cada 50 quilos de mercadoria são pagos 630 kwanzas.
A viagem de táxi até Malanje pode chegar até aos 5.000 kwanzas. Nos arredores de Luanda, o passageiro desembolsa 150 kwanzas por cada percurso.
A viagem Luanda/Malanje passa pelo Mercado do 30 e pela província do Cuanza-Norte, num percurso que dura nove horas. Além do comboio de passageiros, também segue o de mercadorias, que é mais esperado, em função das grandes quantidades de mercadoria que carrega.
Muitos passageiros dependem do transporte de mercadoria. A greve poderá afectar muitas famílias, sobretudo os que se dedicam ao comércio de produtos diversos.
“Viajar de táxi com o negócio torna-se oneroso para a maioria das pessoas de baixo rendimento”, lamenta a jovem Nazaré António, que habitualmente se desloca a Malanje para negócio.
O CFL, em dias normais de trabalho, realizava diariamente 17 viagens de comboio suburbano de passageiros e transporta perto de seis mil pessoas.
Os serviços mínimos dos Caminhos-de-Ferro de Luanda deixaram de operar, na totalidade, desde ontem e sem data prevista para o seu retorno. A decisão foi tomada pelo Conselho de Administração da empresa, alegando razões de segurança.
O Conselho de Administração do CFL alega que a greve tem sido marcada com actos de desobediência das normas de segurança que colocam
em perigo a vida dos passageiros e dos trabalhadores.
O coordenador da comissão negociadora dos trabalhadores dos Caminhos-de-Ferro de Luanda, António Luís Júnior, contraria o posicionamento da direcção, justificando que a entidade patronal devia acautelar essa situação, a julgar pela carência de transporte.
“Não me lembro termos cometido alguma infracção que justifique a paralisação na totalidade.
Apenas fizemos a troca do percurso do comboio da cidade até ao Quilómetro 30. Decidimos fazer um trabalho mais abrangente para beneficiar a população daquela zona”, disse.